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quarta-feira, 15 de julho de 2009

Psiquiatria: Teoria da Libido

Em sua experiência clínica, Freud encontrava um número tão grande de desvios neuróticos relacionados com sexo que sua vocação de pesquisador o levou a estudar mais profundamente o papel da sexualidade no comportamento.
E, como resultado de suas observações, chegou a formular uma teoria segundo a qual todo o comportamento proviria de fontes instintivas intimamente relacionadas com o sexo.
Mas certas atividades dificilmente se poderiam explicar por tal hipótese (por exemplo, o gosto pelos esportes, a avareza e a ambição de mando). E, dentro de seu estilo especulativo, Freud acabou por expandir o conceito a tal ponto que a sexualidade, em si, passou apenas a fazer parte de uma constelação maior de instinto. Essa constelação abrangeria todas as necessidades e todas as tendências de satisfação das necessidades biológicas. Ao conjunto, Freud deu o nome de libido.

O PRAZER DE EXISTIR - A libido, portanto, passou a envolver todas as tendências hedonistas. espreguiçar-se ao sol, comer, ouvir música, passou a ser atividade libidinosa.
Com isso, aparece aqui uma dificuldade semântica. Libidinoso, na doutrina freudiana, não tem a conotação de volúpia sexual que hoje possui na linguagem corrente. Libidinoso, para Freud, era o prazer decorrente da satisfação de qualquer necessidade fisiológica. E a sexualidade representaria apenas o enfoque da libido nas funções genitais.
Dessa forma, na teoria feudiana, a libido estaria presente em todas as fases da vida do indivíduo, inclusive num “período pré-genital”, que iria até os cinco anos de idade. A partir daí, as transformações biológicas que conduzem à puberdade, bem como a consciência de um crescente prazer genital, iriam absorvendo poderosamente o foco da libido.
Se a integração da libido na sexualidade não ocorrer por essa época, achava Freud, estaria ocorrendo aí um fenômeno de “fixação”. E se em idade posterior voltassem a manifestar-se tendências da libido desligadas da sexualidade estaria ocorrendo uma “regressão aos impulsos pré-genitais”.
Para explicar a relação entre libido e comportamento social, Freud formulou a hipótese de que mesmo as atividades comuns representavam impulsos libidinosos coarctados ou sublimados. Assim, a avareza representaria a busca da satisfação erótico-anal de retardar a eliminação das fezes; o esporte seria uma sublimação da rivalidade entre irmãos na disputa da afeição dos pais ou da rivalidade com o pai na disputa do amor da mãe e assim por diante. A vocação dos mártires seria uma sublimação de tendências masoquistas (ou seja de experimentar prazer sexual no sofrimento). A ambição de mando que animaria os homens de empresa seria manifestação do sadismo coarctado. E a arte de pintar representaria o desejo pré-genital de lidar com as próprias fezes.

LIBIDO vs. SEGURANÇA - Tais posições acabaram por parecer um bocado fortes para outros investigadores, sobretudo porque Freud falhou em apresentar comprovações científicas do que afirmava. Sua eloqüente opinião a respeito dos pintores, por exemplo, poderia ser aproveitada jocosamente por um ou outro crítico de arte, mas alguns psicólogos nunca puderam leva-la a sério.
Contudo, a tempestade intelectual e científica desencadeada pelas observações de Freud - quase todas corretas, embora às vezes mal interpretadas por ele mesmo - acabaria por criar-lhe uma aura de inovador e líder incompreendido. Seguiu-se, a seu “martírio de incompreensão” um movimento redentor de beatificação de seu pensamento. E Freud passou a ser um Galeno moderno, contra o qual muitos psiquiatras relutam em levantar a voz.
O principal erro que atualmente se aponta na teoria da libido é o de que a luta pela satisfação das necessidades não é nem o único e nem o ulterior elemento determinante do comportamento. A luta pela segurança precede a da satisfação das necessidades, pois quando falta segurança, quando a consciência do ser se encontra ameaçada, a satisfação das necessidades fisiológicas passa humildemente para segundo plano.
Existir e, simplesmente, ser é uma necessidade que precede qualquer outra, pela razão óbvia de que quem não existe não tem necessidade de coisa alguma. E o sentimento de ser ou existir requer constante reafirmação. A busca dessa reafirmação por sua vez, é tanto mais intensa quanto maior a dúvida.
Nesse ponto poder-se-ia objetar que ninguém sofre normalmente a dúvida de existir. Ainda que toda a realidade fosse uma colossal alucinação, ela existiria: “penso, logo existo”, de Descartes, exprime bem essa idéia de existência.
Mas a dúvida existencial não se refere ao ser ou não ser apenas. Refere-se ao ser como indivíduo dotado de plenas aptidões de continuar existindo. O sentimento de que falta alguma aptidão básica, ou a dúvida a respeito, pode gerar mais angústia neurótica do que a privação de qualquer satisfação fisiológica. E realmente assim acontece.
Hipótese por hipótese, parece muito mais provável que os pintores, como os artistas em geral, os jornalistas, os publicitários apresentam em comum a profunda necessidade de se exprimirem, ou seja, de comunicar.
Dessa maneira, o artista procura ver-se refletido no mundo e identificar-se com ele. Precisa sentir, às vezes, a capacidade de influir no mundo exterior (como o artista de teatro que precisa dos aplausos, ou que é aceito ou ainda outras formas mais sutis e disfarçadas de aprovação. Com isso, busca reafirmar sua segurança e aptidão existencial).
Em outras palavras, o homem não busca só o prazer, mas também a reafirmação de sua capacidade de existir. Nietzsche, que percebeu antes de Freud a importância ulterior da “vontade de poder” (ou seja, de virtualizar as potencialidades), faz Zaratustra dizer a certa altura: “Que importa minha felicidade? Eu aspiro é à minha obra.”
Ironicamente, a satisfação das necessidades pode servir a esse desejo de reafirmação. Há pessoas, por exemplo, que procuram na satisfação sexual uma reafirmação da própria segurança. É como se dissessem: “sinto necessidades (privações) e sou capaz de satisfaze-las; como nem as necessidades e nem a satisfação dessas necessidades podem ocorrer sem aptidão de existir, ao satisfaze-las provo a mim mesmo que existo e que sou capaz de exprimir essa capacidade.”
O mesmo se aplica a pessoas que satisfazem refinadamente necessidades de comer, sem falar no alcoolismo, que exprime certamente uma necessidade de reafirmação e aprovação. Mas esses aspectos mais complicados de comportamento não podem ser discutidos amplamente aqui.
Além desse mecanismo de busca de segurança no campo da libido, existe pelo menos um outro fator que ajuda a teoria da libido a parecer ainda aceitável. A ternura, por exemplo, efetivamente pode preceder o desejo sexual e pode também sucede-lo, depois da satisfação. O desejo de dominar pode realmente encobrir tendências sádicas. E a verificação que os psiquiatras fazem disso, em sua experiência clínica, é um tributo à argúcia de Freud. O que não está provado é que a ternura esteja sempre associada ao desejo, necessariamente: ela poderá exprimir o instinto de proteção materna, que por sua vez exprime o exercício de uma aptidão existencial. E o desejo de dominar pode resultar da necessidade de virtualizar poderes de personalidade e capacidade de liderança, que traduzem a necessidade de exteriorizar a aptidão de existir.
Diante de objeções como essa, a teoria da libido permanece como um dado importante na prática da psicanálise, mas não pode esconder sua insuficiência.
Por isso, atualmente, os psiquiatras procuram bases teóricas seguras e demonstradas para explicar o comportamento humano e aumentar a possibilidade de sucesso no tratamento.

Um comentário:

  1. Gostei muito deste assunto sobre a libido, foi muito importante para as minhas pesquisas, Valeu!

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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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