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quarta-feira, 15 de julho de 2009

Psiquiatria: Angústia

A angústia está presente no espírito da moça que se preparou mal para os vestibulares da faculdade ou no rapaz que se candidata a um emprego. Assalta a mulher apaixonada, na iminência de ser abandonada pelo amante, ou o astro de televisão quando percebe que seu programa perde popularidade. Numa variedade infinita de situações, triviais ou trágicas, a angústia acompanha as sensações de insegurança de forma tão acentuada e freqüente, que não se pode imaginar alguém que não a tenha vivido em certa intensidade.
Para fins práticos, ansiedade e angústia são sinônimos. E, também para fins práticos, pode dizer-se que ansiedade ou angústia sejam formas particulares de medo. As reações fisiológicas que acompanham as sensações de angústia e de medo são basicamente iguais. Angústia, em sua acepção etimológica, significa “estreiteza”. Esse sentido figurado, efetivamente, justifica-se pela idéia de “aperto” que a angústia evoca. Como acontece com o medo, outra reação protetora, angústia determina uma constrição periférica dos vasos, por ação da adrenalina secretada pelas glândulas supra-renais. Também o tônus muscular se altera: o influxo anormal e constante de estímulos nervosos mantém os músculos num estado de semicontração. Como o medo, a angústia leva o indivíduo a preparar-se para a defesa contra algum perigo, real ou suposto, que ameaça destruí-lo.

ANGÚSTIA E MEDO - Em que mais se parecem e no que se diferenciam a angústia e o medo? Ambos constituem resposta a perigos, como se disse, e portanto representam reações de defesa.
À primeira vista, porém, essa explicação não justificaria os efeitos enérgicos que a angústia pode exercer sobre o indivíduo. O operário que está ameaçado de perder o emprego talvez tenha motivo para se deixar dominar pela ansiedade, ao antecipar as dificuldades que enfrentará com o desemprego. Mas o homem aparentemente normal, com estabilidade financeira e conjugal, respeitado e admirado pelos colegas de profissão, sem nada de repreensível em sua conduta moral, poderá ser um dos milhões de portadores inaparentes de angústia crônica. Por quê? De que poderá sentir-se ameaçado para reagir com essa resposta instintiva ao perigo? E, se a angústia tem alguma relação com o medo, qual a origem do temor?
O ajustamento aparentemente perfeito não indica, concludentemente, que a pessoa haja alcançado uma situação de segurança efetiva. O sucesso social, profissional, financeiro e afetivo é muitas vezes conseguido como resultado de uma fraude. O indivíduo, na infância ou em outro período de definição de sua personalidade, pode chegar inconscientemente à conclusão de que o mundo faz sobre ele exigências injustas.
Querem que ele tenha tais sentimentos, tal conduta, tais aptidões e o punem por ser diferente. Em “legítima” defesa, então, a pessoa desenvolve uma personalidade camuflada. Faz concessões para evitar a sanção social, ou a dos pais ou de outras pessoas que ame. Aparenta ser como eles desejam, na medida do possível. Mas preserva certas tendências coartadas, de natureza instintiva. Em certa medida, todo mundo tem em si um pouco da tragédia de Dr. Jekill e Mr. Hyde, os personagens famosos de “O médico e o monstro”.
Se a pessoa se tornar aceita, então, por causa da máscara que usa, sofrerá o receio permanente de que a máscara possa cair. A atitude é muito semelhante à do homem calvo que usa peruca: o medo de revelar sua verdadeira condição, e de expor-se ao que para ele seria uma demonstração de vaidade ridícula, pode gerar ansiedade variavelmente intensa. Similarmente, toda pessoa que não confia nas qualidades reais que possui, como recursos suficientes de aceitação dos semelhantes, sofrerá a angústia indicativa do medo de ser desmascarada. Se viessem a conhece-la como é, segundo supõe, não a aceitariam, não a amariam, não lhe dariam a remuneração financeira ou a gratificação que aufere e de que necessita.
A distinção entre medo e angústia tem sido explicada de vários modos. Alguns acham que o medo é resultante de um perigo real, quando a angústia seria determinada por ameaças imaginárias. Outros, que o medo corresponderia ao perigo de sofrimento e danos físicos, enquanto a angústia representaria o receio de sofrer sanções afetivas ou sociais.
De acordo com a primeira distinção, o medo seria uma reação normal, destinada a proteger o indivíduo contra situações ou coisas que efetivamente o ameaçassem. Seria justificável, por exemplo, sentir medo ao ser obrigado a comer presunto, pela suspeita fundada de o alimento estar deteriorado. E seria neurótica a ansiedade sofrida ante a obrigação de comer presunto porque o indivíduo em tal situação fosse judeu. No primeiro caso, poder-se-ia falar em medo por se haver comprovado que o alimento em deterioração pode ser mortal; no segundo, ter-se-ia de falar em angústia, por não existir nenhuma prova de que a carne de porco seja alimento vedado por Deus e que algum castigo divino puniria os transgressores.
Mas a discussão é falsa. Para o judeu, os motivos seriam tão válidos quanto quaisquer outros. E, se ele efetivamente crê que algo de muito mau possa acontecer-lhe, como conseqüência de haver violado o preceito religioso que o proíbe de comer carne de porco, a ansiedade resultante é perfeitamente justificável e normal.
Já a segunda distinção é mais aceitável. A diferença real entre angústia e medo parece residir na presença ou não de um perigo à integridade física. Não importa que o perigo seja real ou imaginário. A mulher que sai correndo em pânico quando encontra uma barata no armário, na verdade não está sob ameaça de nenhum perigo. Racionalmente, ela também sabe disso. Mas a presença do inseto provoca nela uma reação instintiva de defesa, que com toda propriedade pode ser chamada de medo, pois não difere em nada da sensação que ela experimentaria diante de uma fera.
A angústia, porém, não parece resultar de uma reação instintiva de defesa. Na angústia, as raízes são flagrantemente de natureza sócio-cultural. Em certos povos, uma mulher pode sofrer angústia por ainda ser virgem aos dezoito anos; em outros, por não sê-lo mais. A angústia, portanto, parece ser um “medo cultural”. Isto é, o medo de uma situação que ameaça a estabilidade e o convívio aprovador de outras pessoas.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO - A angústia não é uma doença em si. É antes um sintoma de um precário funcionamento psicológico, que se for acentuado poderá ser chamado de neurótico. Seria o equivalente da febre resultante de uma infecção. Assim, a ansiedade poderá ser objeto de um tratamento paliativo, como no caso de se usar antitérmicos para baixar a temperatura de um doente com infecção.
O psiquiatra, no entanto, não se empenha somente em aliviar o mal-estar da angústia, mas também em remover as causas que lhe dão origem. Drogas de atuação variada sobre o sistema nervoso poderão exercer efeito tranqüilizante, mas não poderão proporcionar as soluções para um ajustamento intrapsíquico e social, que certamente será necessário para a eliminação das causas da angústia. Outras medidas poderão ser tomadas, como os tratamentos por hipnose, relaxamento, sonoterapia, etc. Mas as principais armas da terapêutica psiquiátrica continuam a ser os tratamentos psicológicos (psicoterapias), em suas diferentes modalidades. A indicação de determinado tipo de tratamento dependerá das características peculiares a cada caso.

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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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