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quarta-feira, 15 de julho de 2009

Psiquiatria: Hipnotismo

O hipnotizador toca o braço do “sujet” em transe, com a ponta do dedo, e diz que o queimou acidentalmente. O hipnotizado reage instantaneamente à sugestão, como se houvesse mesmo sido queimado por um cigarro aceso. E, o que é mais surpreendente, no ponto atingido pode ocorrer uma reação inflamatória característica, até mesmo com a formação de uma bolha, depois de alguns minutos.
O transe hipnótico é apenas uma as muitas manifestações de um fenômeno psíquico mais amplo, que é a sugestão. A sugestão atua permanentemente sobre todos os indivíduos, por ação dos mais variados fatores e também com variados efeitos. A propaganda e a pesquisa motivacional são armas do moderno comércio que exploram o mecanismo psicológico da sugestão, embora ainda em bases empíricas e intuitivas. Também a educação depende fundamentalmente desse aspecto da natureza humana, presente em todas as atividades.
Até hoje, todas as observações científicas efetuadas em torno da sugestão tem sido insuficientes para explicar a natureza íntima do mecanismo. Por isso, logicamente, as definições são correspondentemente insatisfatórias. Sugestão seria o processo pelo qual um indivíduo aceita indiscriminadamente idéias provindas de outras pessoas (heterossugestão) ou da própria mente (auto-sugestão). No exemplo da reação à queimadura, os estímulos poderão ser não apenas insignificantes em termos de intensidade, mas até mesmo imaginários, despidos de existência real.
O estado de sugestão pode ser induzido por outras pessoas ou pelo próprio indivíduo, em circunstâncias acidentais ou intencionais. O homem que se toma de pânico aos gritos de “Fogo!” dentro do cinema, age por efeito da sugestão. Mas os exemplos mais dramáticos já observados são os da sugestão hipnótica e os da auto-sugestão. Esta última, que resulta de laboriosos treinamento, produz fenômenos assombrosos que parecem contradizer as leis naturais conhecidas.
Certos indivíduos, por exemplo, conseguem “cravar” a própria língua numa tábua, sem sentirem dor e nem sofrerem hemorragia. A língua, altamente sensível pela inervação profusa, e também muito vascularizada, sangra e dói ao mais ligeiro ferimento, em condições normais. É quase fantástico, portanto, que certos faquires, com o poder da própria vontade, apenas, consigam aí suprimir a dor e provocar o fenômeno da vasoconstrição, isto é, a constrição dos vasos sanguíneos linguais, o que estanca a hemorragia.
E, no entanto, a medicina já comprovou que tais fenômenos efetivamente ocorrem, sem mistificação nem fraude.
Em certas regiões da Ásia, em que o cultivo dos poderes mentais chega a ser um traço cultura, proezas ainda mais impressionantes têm sido verificadas por médicos incrédulos e curiosos: pessoas que caminham descalças sobre pedras aquecidas ao rubro, sem sofrerem queimaduras; faquires que perfuram músculos e membros sem acusarem dor nem hemorragia; místicos que exercem controle tão eficiente sobre o próprio corpo, que chegam até mesmo a interromper temporariamente os batimentos cardíacos, a uma simples ordem.

A MENTE DOMINADORA - A medicina ainda não conseguiu explicação satisfatória e final para os milhares de casos prodigiosos que atestam o poder “sobrenatural” da sugestão. A rigor, nada do que existe é sobrenatural, pois basta a condição de existir para ser natural, ou próprio da natureza. O que acontece, simplesmente, é que o homem ainda não conseguiu investigar adequadamente todos os fenômenos naturais, nem mesmo os que se referem ao próprio corpo.
Tudo o que se pode fazer foi observar os efeitos da sugestão e induzir alguns dos muitos tipos de fenômenos dessa natureza. Em certos casos, as observações se efetuaram sob condições de rigoroso controle médico, de modo a excluir qualquer possibilidade de fraude. Mas esclarecer e explicar a fisiologia da sugestão é tarefa para investigadores científicos do futuro.
Fisiologicamente, o cérebro é em parte uma caixa de mistérios. Sabe-se que existe inter-relação das áreas do cérebro que governam as faculdades psíquicas (notadamente as ligadas à emoção) com as áreas que regem fenômenos fisiológicos - o hipotálamo, por exemplo, órgão cerebral que serve de intermediário entre os dois tipos de função cerebral.
Situações ambientais podem provocar reações psíquicas que repercutem no hipotálamo, que, por sua vez, vai estimular a hipófise; esta, a seu turno, vai atuar sobre as glândulas de secreção interna. É por essa razão que a mocinha pode sofrer uma “suspensão” menstrual depois da briga com o namorado. A emoção sofrida, mero fenômeno psíquico, interfere com o funcionamento do hipotálamo, com repercussões na hipófise e nos ovários, de onde resulta uma desordenada atividade secretória dos hormônios que regem a menstruação.
Essa correlação entre os sistemas nervoso e endócrino serve só para estabelecer o princípio de que fatores psíquicos são capazes de determinar efeitos fisiológicos, mas não explica o mecanismo da sugestão, porque todas as emoções que provocam distúrbios fisiológicos constituem fenômenos involuntários.
Emoções podem provocar erupções cutâneas, desordens gastrintestinais, crises de asma, distúrbios circulatórios, etc. Tudo isso demonstra de mil diferentes maneiras que a mente pode atuar sobre o corpo, mas não explica como é que tais fenômenos fisiológicos podem ocorrer por influência direta da vontade. Nem mesmo atrizes que choram em cena servem de exemplo. Nesse caso, a vontade não atua diretamente sobre a secreção lacrimal, mas sim indiretamente: a atriz, por auto-sugestão, convence-se de que está triste ou desesperada. A vontade, portanto, gera a emoção e a emoção determina o fenômeno fisiológico de verter lágrimas. O ato fisiológico, portanto, continua sendo involuntário, resultante de uma emoção.

CONDICIONANTES DA SUGESTÃO - todas as pessoas são sugestionáveis em certa medida. Na moderna civilização urbana não existe ninguém que não revele, em seus hábitos de consumo, alguma influência da propaganda comercial, que envolve recursos empíricos de sugestão, embora não dependa exclusivamente de tais recursos.
A sugestionalibilidade varia em função de quatro grupos básicos de fatores: 1) fatores estruturais intrínsecos: são os que dependem de atributos da personalidade do indivíduo, tais como suas tendências neuróticas à autodesvalorização, com a necessidade conseqüente de depender de outros seres; 2) fatores estruturais extrínsecos, que se referem à natureza dos estímulos. No caso da sugestão hipnótica, o grupo abrangeria o conjunto de efeitos tácteis, luminosos e sonoros, bem como a impressão causada pela personalidade do hipnotizador; 3) fatores circunstanciais intrínsecos, referentes às condições em que o indivíduo se encontre no momento, tal como o estado de relaxamento muscular, que predispõe à aceitação do estímulo indutivo da sugestão; 4) finalmente, os fatores circunstanciais extrínsecos, que envolvem as condições gerais dos estímulos indutivos, independentemente de sua natureza (por exemplo, a freqüência com que os estímulos de sugestão são repetidos).
Na prática, esses grupos de fatores atuam interdependentemente e estruturam situações de variada eficiência na produção de fenômenos sugestivos.

O HIPNOTISMO - Segunda Parte

De tudo quanto foi exposto no artigo anterior, percebe-se que a sugestão é uma condição especial em que os centros nervos que comandam a vida vegetativa ficam subordinados aos centros que regem a vida psíquica. Nessa condição, portanto, o corpo se comporta em obediência à vontade da pessoa, uma vez que a vontade é uma faculdade psíquica.
A correlação entre vida psíquica e vida vegetativa sempre existe, como o comprovam os exemplos citados, em que as emoções produzem efeitos fisiológicos. Mas no estado de sugestão a interdependência se acentua. Segundo parece, de fato, a sugestão apresenta gradações. Ou seja, a pessoa poderá estar muito ou pouco sugestionada, conforme sua sensibilidade e a eficiência dos agentes da sugestão. E também, segundo se demonstra empiricamente, tanto a sugestionabilidade quanto a eficiência dos agentes indutivos da sugestão podem ser desenvolvidos por treinamento.

O TRANSE HIPNÓTICO - O estado hipnótico ou transe hipnótico é um tipo de sono induzido por sugestão. A sugestão é o condicionante básico, pois sem ela não há hipnose. Para alguns autores, a hipnose não encerra necessariamente o transe hipnótico. Segundo eles, a hipnose é apenas uma forma do estado de sugestão, que poderá envolver ou não a perda de consciência característica do transe.
Em transe hipnótico, o sujet (pessoa hipnotizada) aprece portar-se como um sonâmbulo. Nesse estado, obedece às ordens da pessoa que induziu o transe, porque a identidade dessa pessoa está bastante ligada à sua. Quando recebe ordens do hipnotizador, o sujet responde a elas como responderia a ordens de seus próprios centros cerebrais superiores.
Correspondentemente, poderá relutar ou recusar-se a obedecer ordens que entrem em flagrante conflito com seus arraigados preceitos morais. Em geral, a força da sugestão é inferior ao condicionamento psicológico trazido por anos de submissão a padrões morais.
O caráter misterioso do mecanismo da sugestão e da hipnose tem propiciado toda sorte de exploração mal-intencionada ou mística. Franz Anton Mesmer, um médico do século XVII, talvez tenha sido o mais famoso dos hipnotizadores conhecidos na história. Não foi o primeiro, porque os poderes da sugestão e da hipnose são conhecidos e cultivados há milênios em culturas orientais. Mas tornou-se o mais famoso pela profusão espantosa de curas e pelos efeitos dramáticos de suas demonstrações.
Mesmer, porém, acreditava que o transe hipnótico a que induzia seus pacientes provinha de um misterioso “magnetismo animal”, um fluido indefinível que ele transmitia a seus sujets através de varinhas metálicas. Parece, porém, que a par de sua imponente personalidade e segurança, falem de fatores de ambiente favoráveis (pelo aparato impressionante), Mesmer não tinha muita dificuldade em induzir pessoas a transe hipnótico, alucinações e convulsões histéricas. As pessoas que o procuravam certamente já se apresentavam predispostas à indução hipnótica, sobretudo por se tratar, na maioria, de pessoas sugestionáveis, de tendências místicas.
Outra personagem famosa no campo foi Mary Baker Eddy, líder mística de personalidade comparável à de Mesmer. Mary Baker Eddy, porém, supunha que seus dotes de indução hipnótica fossem uma graça divina que Cristo lhe atribuía para a missão de curar. E, efetivamente, curas prodigiosas foram comprovadamente obtidas por ela no século passado. Os seguidores de Mary Baker Eddy manteriam e desenvolveriam depois a organização conhecida internacionalmente como Christian Science, dedicada a pesquisas científicas e objetivos religiosos. Sua publicação, o “Christian Science Monitor”, apesar da discutível posição religiosa da organização que a edita, é considerada como um respeitável órgão científico.

O “RAPPORT” - A existência de personagens como esses, que se notabilizaram como grandes hipnotizadores, gerou a idéia de que o hipnotismo depende da ação dominante da personalidade de um indivíduo sobre outro. Esse erro é alimentado pela possibilidade de o indutor da hipnose levar o sujet a obedecer a ordens, ainda que limitadas.
Não é assim. Em hipnose, um princípio básico é o de que toda sugestão é essencialmente auto-sugestão e que todo estado hipnótico é na verdade auto-hipnose. O hipnotizador é apenas um dos elementos condicionantes, às vezes decisivo.
Acontece, porém, que, quando a pessoa do hipnotizador se apresenta como um elemento condicionante eficiente, se estabelece entre ela e o sujet um estado de “sintonia” psicológica, tecnicamente chamada rapport. O rapport favorece a indução da hipnose e, em certa medida, a facilidade de estabelece-lo constitui um atributo da personalidade do hipnotizador.
O papel do agente, assim, favorece a hipnose, que como se viu é sempre auto-hipnose, pois ninguém pode ser hipnotizado contra a vontade. Conforme a intensidade do rapport estabelecido (e o rapport aumenta com o número de sessões), o sujet pode ser levado a estados variáveis de hipnose. Assim como os anestesistas dividem o estado de insensibilidade e inconsciência em planos, também em hipnose arbitrou-se uma divisão do estado em etapas: a superficial (também chamada hipnoidal e leve), a média, a profunda e a sonambúlica. Quanto mais avançada a etapa, maior a receptividade do sujet à orientação sugestiva do hipnotizador. Essas várias etapas, em medicina, propiciam variadas aplicações da técnica. Acredita-se que apenas 10% dos pacientes conseguem atingir o transe sonambúlico e que cerca de 12% não são hipnotizáveis, mesmo em condições técnicas as mais favoráveis.

APLICAÇÕES MÉDICAS - Talvez a mais importante das etapas, embora proporcione resultados menos dramáticos, seja justamente a etapa superficial. Nessa etapa pode-se obter relaxamento corpóreo compensador para os estados de angústia, até com alívio total.
A grande maioria das pessoas pode treinar a auto-sugestão e o relaxamento como uma prática diária que conduz a proveitos mais amplos do sono normal, melhora a irrigação sanguínea, alivia os estados depressivos e de angústia, reparando em parte os efeitos da tensão emocional da vida moderna.
Nas etapas médias, a hipnose tem sido empregada com relativo sucesso no tratamento de algumas doenças provocadas por causas nervosas ou de fundo alérgico-emocional, como por exemplo, a asma brônquica.
Na gravidez pode ser indicada para tratamento dos vômitos e/ou na preparação e realização de um parto normal. Em odontologia, a aplicação da hipnose em etapa média ou profunda permite aliviar a tensão nervosa do paciente e mesmo obter anestesia total, sem perda de consciência, suficiente para a execução de extrações dentárias e outras medidas de tratamento local.
A etapa profunda é particularmente indicada em psiquiatria, pois em tal estado o paciente pode falar e responder a perguntas do médico sem abandonar o transe. Reduzidas as inibições, o paciente revela então episódios significativos de sua formação psicológica, o que pode simplificar e abreviar consideravelmente o tratamento psicoterápico. Mas essa técnica, a hipno-análise, envolve outros problemas, o que tem restringido sua aplicação.
A fase sonambúlica é ainda mais profunda e, portanto, envolve redução ainda mais acentuada de inibições, além de possibilitar o aparecimento de episódios esquecidos, quando o psiquiatra induz o paciente a regredir a uma determinada fase de sua infância. É a chamada regressão de idade, de uso limitado a casos especiais.

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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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