Assuntos relacionados à saúde em geral, medicina ocidental, oriental, alternativa, trechos de livros e revistas.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Reumatologia: Artropatias por Cristais


Cássio L. Engel


São reconhecidos quatro tipos principais de cristais que podem se depositar nas articulações, determinando vários padrões de artrite:


1. Cristais de urato monossódico (gota) 
2. Cristais de pirofosfato de cálcio (pseudogota) 
3. Cristais de oxalato de cálcio 
4. Cristais de apatita de cálcio


À exceção dos cristais de urato monossódico, os demais são compostos de cálcio, e, desta forma, ao se depositarem nas articulações, causam a sua calcificação. A calcificação das articulações por depósitos de cristais de cálcio é denominada condrocalcinose, e pode ser prontamente visualizada nas radiografias convencionais.

O diagnóstico das artropatias por cristais, seja qual for, depende da aspiração do líquido sinovial das articulações acometidas, e da identificação destes cristais no microsc´pio sob luz polarizada.

A palavra gota faz referência na verdade a um grupo amplo e heterogêneo de situações mórbidas, que, quando plenamente desenvolvidas, justificam:

- Aumento dos níveis séricos de ácido úrico (hiperuricemia) 
- Crises repetidas de artrite aguda típica 
- Presença de cristais de monohidrato monossódico de ácido úrico nos leucócitos do líquido sinovial das articulações acometidas 
- Depósitos confluentes de monohidrato monossódico de ácido úrico (os tofos) nas articuçaões (no seu interior ou mediações), podendo causar sérias deformidades e incapacidade física 
- Nefropatia intersticial e vascular 
- Nefrolitíase à base de ácido úrico

Um paciente com gota pode tanto apresentar todas estas manifestações ao mesmo tempo, quanto apenas uma delas isoladamente.


Conceitos Gerais


Se num copo d’água formos adicionando cristais de açúcar, no início, estes ficarão inaparentes, solubilizados na água. Após determinada quantidade, entretanto, haverá precipitação visível, diretamente proporcional à quantidade de açúcar adicionada.

O ácido úrico está, em indivíduos normais, solubilizado no soro. Quando os níveis séricos deste sal aumentam muito, o limite de solubilidade pode ser atingido, ocorrendo precipitação. Diz-se que há hiperuricemia quando estes ultrapassam 7 mg/100ml no homem e 6 mg/100ml na mulher, exatamente os valores limites de solubilidade plasmática para ambos os sexos.

Deve-se tomar cuidado para não confundir o achado laboratorial de hiperuricemia com a doença gota. Praticamente, todos os indivíduos com gota apresentam hiperuricemia, mas nem sempre os que têm hiperuricemia desenvolvem gota. Obviamente, quanto maior a concentração sérica de ácido úrico e quanto maior o tempo que um paciente estiver submetido à hiperuricemia, maiores serão as possibilidades de desenvolvimento da doença.

Epidemiologia


A gota é uma doença que afeta essencialmente os homens adultos, a partir dos 50 anos, sendo muito pouco comum em mulheres. A forte predominância masculina (de 95%), entretanto, vem sendo questionada em estudos mais recentes, que já evidenciaram uma participação crescente das mulheres para o total de casos desta condição (alguns revelam cifras de até 15%).


Rarissimamente se manifesta em crianças e em homens com menos de 30 anos de idade. Nos homens suscetíveis à gota clássica, a hiperuricemia costuma ter início na época da puberdade (como se fossem necessárias algumas décadas de depósitos de cristais para a expressão clínica da doença).
  
Existe certamente um fator genético no desenvolvimento da gota, o que justifica sua maior incidência entre parentes de primeiro grau.


Origem da Hiperuricemia


A hiperuricemia pode resultar tanto de um excesso de produção quanto de uma falha na eliminação do ácido úrico.


O ácido úrico não é um componente normal dos alimentos e costuma ser produzido no organismo a partir das purinas. Dietas excessivamente ricas em purinas podem estar associadas à hiperuricemia. Deve-se lembrar, entretanto, que os alimentos não são a única fonte das purinas, pois o organismo também recicla o DNA que se origina do turn-over celular normal. Assim, a oferta excessiva de purinas pode ocorrer pela própria dieta, ou pela reutilização exagerada dos ácidos nucléicos teciduais, particularmente nas malignidades hematológicas e na terapia citotóxica (síndrome de “lise tumoral”).

A hiperprodução endógena de ácido úrico pode ser resultante também de alguns distúrbios enzimáticos já bem documentados, de caráter herdado, como a deficiência de hipoxantino-guanina-fosforribosil transferase. Na maioria dos casos, entretanto, a hiperuricemia acaba se originando de uma combinação entre oferta excessiva de purinas (dietética ou não) e redução da eliminação renal de ácido úrico.

Alguns fatores externos estão reconhecidamente relacionados à hiperuricemia, e devem ser, dentro do possível, neutralizados nos pacientes com aumento da uricemia. Os principais são: o álcool e a obesidade.


- Álcool: O álcool resulta em hiperuricemia principalmente por determinar um desbalanço do piruvato para o lactato, o que acaba reduzindo a excreção renal de urato. Além disso, sabe-se que a cerveja contém uma quantidade significativa de purina. - Obesidade: A obesidade está relacionada a uma redução da excreção urinária de ácido úrico e, embora não se saiba ao certo o mecanismo responsável, esta alteração é reversível com a perda de peso. Aumentos consideráveis da excreção urinária de ácido úrico podem ser conseguidos muitas vezes com uma redução apenas discreta de peso.

Manifestações Clínicas


A evolução natural da gota se realiza em quatro etapas subsequentes: 


1 - Hiperuricemia assintomática 
2 - Artrite gotosa aguda 
3 - Gota intercrítica 
4 - Gota tofosa crônica 


Obs.: a nefrolitíase pode se manifestar no decorrer de quaisquer destas etapas, à exceção da primeira.


1 - Hiperuricemia Assintomática


É o estágio que se caracteriza pelo aumento dos níveis séricos de ácido úrico, sem que existam sintomas de artrite, tofos, ou cálculos – ou seja existe o aumento do ácido úrico sérico, mas, por definição, não se identifica nenhuma consequência (aguda ou crônica) do seu depósito nos tecidos corpóreos.

A hiperuricemia assintomática pode permanecer toda a vida sem acarretar consequências manifestas, entretanto, o risco de desenvolvimento de artrite gotosa e nefrolitíase aumenta em função do grau e duração da hiperuricemia.


2 - Artrite Gotosa Aguda


A principal manifestação da crise aguda de gota é a artrite extremamente dolorosa. Na maior parte dos pacientes, é monoarticular e acompanhada de poucos sinais gerais. Posteriormente, torna-se poliarticular e sobrevem febre. Uma menor parte dos pacientes abre o quadro de artrite gotosa já com um quadro poliarticular.

Independente do tipo de acometimento articular, as crises perduram por tempo variado, mas sempre limitado, seguidos por intervalos assintomáticos: o período intercrítico.


Em pelo menos metade dos casos, a primeira crise de artrite se localiza na primeira articulação metatarsofalangiana, e chega a 90% o número de pacientes que referem alguma crise aguda localizada no grande artelho (podagra).

As manifestações de artrite gotosa quase sempre se localizam nos membros inferiores – as crises costumam ser tanto mais típicas quanto mais distal for a sua localização. Depois do grande artelho, os principais locais acometidos (em ordem) são: metatarsos, tornozelos, calcanhares, joelhos, punhos, dedos e cotovelos. O acometimento de articulações como ombro, quadril, coluna, sacroilíaca, esterno-clavicular e mandíbula, geralmente indica gravidade e cronicidade.

A crise de artrite gotosa típica normalmente tem instalação explosiva, sem sintomas prodrômicos, embora alguns pacientes experimentem episódios de dor leve, anunciando-a. Frequentemente, existem fatores predisponentes, como traumatismos, alguns medicamentos, consumo de álcool (especialmente cerveja e vinho), e outros.

As grandes crises frequentemente se iniciam durante a noite e são extremamente dolorosas. Ocorrem sinais francos de inflamação articular que, frequentemente, fazem lembrar uma artrite piogênica. As manifestações sistêmicas da artrite gotosa aguda incluem: febre, leucocitose e aumento do VHS. Sydenham descreveu o episódio típico de artrite gotosa aguda: “A vítima se recolhe para dormir, encontra-se em perfeito estado de saúde. Por volta das duas horas da madrugada, ela é despertada por intensa dor em grande artelho (mais raramente no calcanhar, tornozelo ou metatarso). A dor lembra bastante aquela de luxação, mas o local afetado dá a impressão tátil de ter sido regado com água fria. Segue-se então febre moderada, com calafrios e tremores. A dor, os tremores e calafrios tendem a se acentuar ainda mais, e agora o acometimento tende a se estender aos ossos, ligamentos do tarso e metatarsos. A hiperestesia tátil é tão grande que o paciente não tolera nem o peso dos cobertores. O paciente passa uma noite de tortura e insônia, virando o membro afetado e mudando constantemente de posição, na tentativa de aliviar a dor.”

O primeiro episódio de artrite gotosa é sinal de que o nível sérico de ácido úrico se manteve suficientemente alto durante um prazo bastante longo, a ponto de permitir um acúmulo tecidual de grandes quantidades do mesmo.

Nas mulheres, a gota costuma se manifestar mais tarde, geralmente após os 60 anos. Muitas delas se encontram em curso de diureticoterapia.


3 - Período Intercrítico


A crise de gota aguda é geralmente autolimitada, resolvendo-se espontaneamente dentro de um período que vai de três dias a algumas semanas. A resolução é completa e não se obsevam sequelas. Após uma crise, inicia-se então um período em que o paciente fica completamente assintomático, denominado período intercrítico. O período intercrítico é fundamental na caracterização do quadro de gota, permitindo a exclusão de alguns diagnósticos diferenciais importantes.

Aproximadamente 7% dos pacientes nunca chegam a ter uma segunda crise, mas cerca de 60% dos pacientes acometidos por um episódio de crise gotosa aguda apresentam recidiva dentro de um a 10 anos.

Com o tempo, as recaídas passam a ser mais frequentes e duradouras, e as resoluções começam a não ser mais totais, deixando comprometimento residual. As crises posteriores são mais graves, tendem a assumir um caráter poliarticular, e mais frequentemente vêm acompanhadas de febre.

Neste estágio final, às vezes torna-se difícil estabelecer o diagnóstico diferencial com outras formas de artrite poliarticular como, por exemplo, a artrite reumatoide. É importante ter em mente que alguns casos raros de crise gotosa aguda, já se iniciam com poliartrite aguda, sem período intercrítico.


4 - Gota Tofosa Crônica


Quando ocorre hiperuricemia não tratada por longo prazo, pode haver a formação e depósito de cristais de urato monossódico nas cartilagens, membranas sinoviais, tendões e partes moles. A sede clássica (mas não a mais frequente) dos tofos, é a hélice do pavilhão auricular externo.

Muitas vezes os tofos se ulceram, eliminando uma substância de aspecto calcário ou pastoso, rica em cristais de urato monossódico. A identificação do sal monossódico na análise da secreção classifica o nódulo como tofo gotoso.

Nos pacientes que apresentam grande número de tofos, as manifestações articulares parecem ser mais benignas e menos frequentes. Em casos raros, a gota tofosa crônica se manifesta antes da crise gotosa aguda.

Os tofos, assim como as manifestações articulares, tendem a regredir completamente com o tratamento adequado contra a hiperuricemia.


5 - Nefropatia Gotosa


Cerca de 90% dos pacientes com artrite gotosa apresentam certo grau de disfunção renal. Os cristais de ácido úrico podem causar nefropatia pela sua deposição no parênquima renal, ou seja, no interstício, num processo fisiopatológico ainda pouco conhecido, e ainda podem causar uropatia obstrutiva pela sua deposição nos túbulos coletores e ureteres. A insuficiência renal que se observa nestes casos guarda mais relação com a hiperuricacidúria do que com a hiperuricemia. A necropsia evidencia as precipitações intraluminares de ácido úrico e a consequente dilatação dos túbulos proximais.

Até 25% dos pacientes com gota apresentam formação de cálculos renais e, se os níveis séricos de ácido úrico ultrapassarem 13 mg/dl, a incidência de nefrolitíase pode alcançar 50%. Os principais fatores que contribuem para a formação de cálculos renais na gota são: 1 queda do pH urinário 2 aumento da concentração urinária (hiperosmolaridade urinária).

Diagnóstico


Convém suspeitar de gota aguda em todo paciente que desenvolva artrite monoarticular de instalação súbita, sobretudo se localizada em uma das articulações distais de um membro inferior. Lembrar que, diante de uma monoartrite, a punção do líquido articular estará sempre indicada para diagnóstico.

O diagnóstico de gota pode ser confirmado com absoluta certeza pela presença dos cristais típicos de urato monossódico no interior dos leucócitos do líquido sinovial da articulação afetada. A análise deve ser realizada em microscópio de luz polarizada, que revela cristais típicos em forma de bastonete, com forte birrefringência negativa.

Obs.:

1) Caso não sejam encontrados tais cristais em exame minucioso, não se pode excluir gota – menos de 5% dos casos de artrite gotosa se enquadram neste grupo. 

2) Mesmo que os cristais sejam encontrados na articulação acometida, isto não exclui a possibilidade de outra artropatia associada. Em todo caso suspeito de artrite gotosa aguda, deve-se sempre afastar a possibilidade de artrite piogênica, que pode possuir clínica muito semelhante e até estar associada à própria gota. 

3) A presença de cristais de cálcio no líquido articular pode fazer confusão com os cristais de ácido úrico e simular gota, como na pseudogota (ver adiante). Entretanto, esta distinção pode ser facilmente realizada com o exame microscópico de luz polarizada. 

4) A punção do líquido articular não precisa ser repetida a cada crise, a não ser que se suspeite de alguma outra patologia envolvida.


Quando não se consegue colher o líquido sinovial para demonstração dos cristais, o diagnóstico de gota pode ser considerado altamente provável caso o paciente apresente: 

1 - hiperuricemia 
2 - quadro clínico característico (descrito acima) 
3 - resposta significativa à administração de colchicina (ver tratamento)

Os antecedentes de episódios de artrite monoarticular aguda de duração autolimitada, a presença de tofos, as alterações típicas no RX e a comprovação da hiperuricemia, falam bastante a favor de gota crônica.


Exame completo do paciente com Hiperuricemia


Todo paciente portador de hiperuricemia deve ser exaustivamente investigado, na tentativa de se definir os seguintes pontos:

1 – existe alguma doença de base responsável pela hiperuricemia que não a gota? 
2 – existe comprometimento dos tecidos e órgãos? Qual a sua extensão?

A pesquisa de ácido úrico na urina é talvez o exame de maior valor para avaliação do paciente hiperuricêmico assitomático. Uma das poucas indicações para o tratamento desta condição é a presença de ácido úrico em quantidades superiores a 1.110 mg/dia.

Em pacientes hiperuricêmicos assintomáticos, que possuem antecedentes de nefrolitíase, devem ser solicitadas radiografias simples de abdome e urografia excretora. Se existirem cálculos, estes devem ser analisados quanto ao seu teor de ácido úrico sempre que possível.

Se um paciente hiperuricêmico desenvolve artropatia, é fundamental a avaliação do líquido sinovial das articulações acometidas e os exames que devem ser solicitados são:

1 – pesquisa de cristais de urato monossódico em exame com microscópio óptico sob luz polarizada 
2 – gram e cultura do material (para afastar possibilidade de artrite piogênica) 
3 – RX da articulação acometida

Se um paciente hiperuricêmico relata exposição ao chumbo, indica-se a dosagem deste metal na urina após a infusão de edetato de cálcio, com o objetivo de comprovar a presença de gota secundária a intoxicação saturnínica.


Tratamento


1 – cortar a crise aguda de maneira mais rápida possível 
2 – prevenir as recidivas da artrite gotosa aguda 
3 – prevenir as complicações do depósito de cristais de ácido úrico nas articulações, rins e outros órgãos 
4 – prevenir a formação de cálculos renais 
5 – combater fatores associados, como obesidade, hipertriglicidemia e hipertensão arterial sistêmica

O tratamento da gota deve ter os seguintes objetivos:

1 – Tratamento da Criste Gotosa Aguda 

Os medicamentos que podem ser usados para o tratamento da crise aguda de gota são:

1 – AINEs 
2 – Colchicina 
3 – Corticóides

A artrite gotosa aguda deve ser manipulada inicialmente com qualquer dos antiinflamatórios não esteroidais do grupo da aspirina, como a indometacina, diclofenaco, fenoprofeno, cetoprofeno, etc. (a indometacina é o mais frequentemente utilizado). A colchicina, apesar de já ter sido amplamente usada, atualmente costuma ser reservada para aqueles que apresentam alguma contra-indicação ao uso dos AINEs. Os antiinflamatórios não-hormonais têm um efeito mais rápido que o da colchicina. Os corticosteroides intrarticulares são também uma opção para a artrite gotosa aguda, quando não se pode (ou não se deseja) o uso dos AINEs ou da colchicina.

Uma recomendação importante, que deve ser feita para aqueles que já tiveram uma primeira crise, é ter a medicação (qualquer que seja) sempre disponível para que possa ser utilizada ao primeiro sinal de um ataque agudo. Tomadas precocemente, apenas algumas doses iniciais podem ser suficientes para cortar uma crise aguda.

A colchicina é um inibidor dos microtúbulos e microfilamentos, que são estruturas intracelulares responsáveis basicamente pela movimentação celular. Assim, em resumo, a colchicina tem sua ação ‘antiinflamatória’ baseada na inibição da movimentação dos leucócitos intrarticulares dos pacientes com gota. Como a fagocitose dos cristais pelos leucócitos sinoviais é fundamental para a gênese da inflamação.

A colchicina é considerada específica para gota, embora possa aliviar também formas de artrite relacionadas a outros cristais (como hidroxiapatita) à sarcoidose e à psoríase. Usualmente é encontrada em comprimidos de 0,5 mg.

A dose terapêutica da colchicina é muito próxima da tóxica, e os principais efeitos colaterais de seu uso incidem no trato gastrointestinal (diarreia e vômitos). Altas doses podem levar à má absorção, gastroenterite hemorrágica e em alguns casos a um distúrbio mioneuropático.

1.1- Esquemas

1.1.1- Indometacina: 75 mg – V.O. (dose inicial), seguida por 50 mg de 6/6 horas por dois dias, ou até o alívio da dor. Em sequência, esta dose deve ser reduzida para 3 vezes ao dia, e, por fim, reduzida para 25 mg 3 vezes ao dia, mantida até por 2 dias após a remissão completa da inflamação. Em geral, os pacientes experimentam uma melhora sistomática dentro das primeiras 2 horas.

1.1.2- Colchicina: 1 mg – V.O. (dose inicial), seguido por 0,5 mg a cada 2 horas, até que haja: - melhora do quadro - aparecimento de efeitos colaterais relacionados ao aparelho gastrointestinal (diarreia ou vômitos) - acúmulo da dose máxima (8 mg)

1.1.3- Colchicina: 1 a 2 mg – E.V. (dose inicial), podendo ser repetida após 6 horas.

ATENÇÃO: 

Não devemos confundir as medidas que visam resolver a crise aguda de artrite gotosa com as medidas que visam reduzir a hiperuricemia para prevenir as complicações futuras do depósito de cristais de ácido úrico nas articulações, rins e outros órgãos. A redução da hiperuricemia não faz parte do tratamento da crise de artrite aguda da gota. Pelo contrário, alterações bruscas dos níveis de ácido úrico sérico e, consequentemente, dos níveis de ácido úrico sinoviais (tanto para mais quanto para menos), podem até agravar a artrite. O tratamento da hiperuricemia só deve ser instituído após o controle adequado da artrite aguda e após a introdução de doses profiláticas de colchicina (ver adiante).

2 – Profilaxia das Crises

Os principais esquemas capazes de reduzir o perigo de recaída, após resolução de uma crise aguda são: 

1 – administração profilática diária de 1 mg de colchicina 
2 – regime de emagrecimento, sob supervisão médica, no caso de pacientes obesos 
3 – eliminação de possíveis fatores predisponentes, como álcool, alimentação rica em purinas, etc. 
4 – instituição do tratamento contra a hiperuricemia

A administração de 0,5 mg 12/12 h de colchicina proporciona resultados satisfatórios em mais de 75% dos pacientes, sem que hajam quaisquer efeitos colaterais significativos.

Obs.: 

Não se deve confundir a prevenção das crises gotosas com o próprio tratamento para gota. Os pacientes recebendo doses diárias de colchicina, mesmo livres da recaída das crises agudas, ainda estão sujeitos às outras manifestações da doença, a menos que tenham seus níveis séricos e ácido úrico mantidos dentro de limites normais.

3 – Prevenção das complicações da Gota Crônica: a redução da Uricemia

A prevenção das complicações da gota consiste basicamente em tentar manter os níveis de ácido úrico abaixo da capacidade de saturação sérica, ou seja, abaixo de 7 mg/dl. A redução da concentração sérica de ácido úrico pode ser conseguida através de dois mecanismos principais:

1 – redução na sua síntese (Alopurinol) 
2 – estímulo a sua excreção renal (Uricosúricos)


3.1- Alopurinol


A hiperuricemia pode ser controlada pelo alopurinol, substância que diminui a síntese de ácido úrico. 300 ml em dose única diária costumam ser eficazes na maioria dos pacientes. Os principais efeitos colaterais do alopurinol são a febre, exantemas, necrólise tóxica da epiderme, aplasia de medula, hepatite, icterícia e vasculite.


Existem indicações específicas para a preferência do alopurino em relação aos uricosúricos: 


1 – eliminação urinária de ácido úrico acima de 700 mg/dia 
2 – comprometimento da capacidade funcional dos rins 
3 – presença de calculose renal por ácido úrico 
4 – intolerência ou ineficária aos uricosúricos


Nos raros casos em que nem os uricosúricos nem o alopurinol conseguem reduzir a hiperuricemia, pode-se fazer a tentativa de administrá-los em conjunto. Quando se opta por esta associação, não é necessário alterar as doses individuais. Entretanto, sabe-se que o alopurinol prolonga a meia-vida dos uricosúricos que, por sua vez, aumentam a excreção renal do alopurinol.


Como já mencionado, a crise aguda de artrite pode ser induzida mediante qualquer alteração súbita dos níveis séricos de ácido úrico, tanto para mais, quanto para menos. A instituição do tratamento anti-hiperuricêmico pode precipitar uma crise. Assim, antes de prescrever um anti-uricêmico (tanto alopurinol quanto uricosúrico) é fundamental a instituição de um tratamento profilático com colchicina, que deve ser mantida até após um ano de completa melhora dos níveis séricos de ácido úrico, ou até que todos os tofos tenham desaparecido.


A restrição rigorosa das purinas é desnecessária na grande maioria dos casos de gota, devendo ser prescrita apenas para os pacientes que apresentam numerosos tofos ou insuficiência renal.


3.2- Uricosúricos


Os agentes uricosúricos mais eficazes são a probenecida e a fulfimpirazona. Como os uricosúricos inicialmente causam aumento importante da excreção renal de ácido úrico, 10% dos pacientes acabam desenvolvendo cálculos renais. Para tentar amenizar este efeito, os uricosúricos devem ser administrados em doses baixas no início do tratamento, aumentando-as gradativamente. A alcalinização da urina através do uso oral de bicarbonato de sódio, isoladamente, ou em associação com acetazolamida, pode ajudar a prevenir a nefrolitíase.


O candidato ideal para o tratamento com uricosúricos tem menos de 60 anos, tem rins com função normal, eliminação diária de ácido úrico inferior a 700 mg e não apresenta antecedentes de nefrolitíase.


4 – Prevenção da Nefropatia Aguda


1 – aumentar a diures: 


hidratação generosa + adiminstração de um diurético de alça (furosemida) 


2 – alcalinizar a urina: 


administração de bicarbonato de sódio na dose única de 8 mg/kg/dia, isoladamente, ou associado à acetazolamida 


3 – reduzir a hiperuricemia com as medidas descritas acima (alopurinol / uricosúricos)


5 – Tratamento da Hiperuricemia Assintomática


Não existe indicação para o tratamento medicamentoso dos pacientes com hiperuricemia assintomática, a não ser quando:


1 – os níveis séricos de ácido úrico estiverem em valores muito altos (acima de 12 mg/dl) 
2 – a excreção de ácido úrico urinário ultrapassar 1.100 mg/dl 
3 – uma superprodução de ácido úrico puder ser prevista, como na síndrome de lise tumoral.


II – DOENÇA POR DEPÓSITO DE PIROFOSFATO DE CÁLCIO


O depósito de pirofosfato de cálcio ocorre mais frequentemente em indivíduos de mais idade e se caracteriza clinicamente pelo desenvolvimento de artropatia inflamatória aguda ou crônica. A forma aguda desta artrite é conhecida como pseudogota.

A deposição de cálcio nos meniscos e cartilagem articular adquire frequentemente um padrão linear ou pontilhado, sendo denominado condrocalcinose. A condrocalcinose pode ser detectada radiologicamente em quase todos os pacientes com esta condição.


Praticamente todas as articulações podem ser afetadas, mas os joelhos, punhos e a segunda e terceira articulações metacarpofalangianas são acometidos mais comumente.


Manifestações Clínicas


Existem diversos padrões de comprometimento articular na doença por depósito de cristais de pirofosfato de cálcio:


1 – Forma Aguda: Pseudogota


Ocorre em 25% dos pacientes. O início é súbito, atingindo seu pico geralmente em 24 horas, e se caracterizando pelo desenvolvimento de sinais francos de inflamação nas articulações envolvidas. De modo geral, a crise aguda compromete apenas uma articulação, mas em alguns pacientes pode evoluir rapidamente para um processo apoliarticular. O joelho é o local mais frequentemente acometido, embora as outras articulações principais (tornozelo, cotovelo, quadril, coluna, etc.) também possam estar envolvidas. A articulação metatarsofalangiana do hálux pode estar acometida e, além disto, a pseudogota também pode se relacionar a fatores precipitantes (como traumatismos), lembrando bastante a crise gotosa aguda. Em geral, os episódios de artrite são intermitentes, sendo a mesma articulação afetada em crises subsequentes. Tendem a permanecer por uma a duas semanas.


A maioria dos pacientes com pseudogota apresenta evidências radiológicas de condrocalcinose.


2 – Forma Subaguda: Doença Pseudo-Reumatóide


Cerca de 5% dos pacientes com doença por depósito de cristais de pirofosfato de cálcio apresentam um distúrbio subagudo denominado doença pseudo-reumatóide, caracterizada por um comprometimento poliarticular, com crises subagudas que duram várias semanas ou até meses. Os pacientes se queixam de rigidez matinal e de fadiga, podendo eventualmente ocorrer limitação dos movimentos de deformidades articulares de flexão.


3 – Forma Crônica


50% dos pacientes com doença por depósito de cristais de pirofosfato de cálcio apresentam uma forma crônica de apresentação. Este grupo é composto principalmente por mulheres de meia-idade e idosas. As alterações articulares degenerativas são lentamente progressivas e tendem a acometer várias articulações (embora o joelho ainda seja o local mais acometido). Metade dos pacientes deste grupo sofre crises agudas intermitentes.


Diagnóstico


A análise do líquido sinovial mostra a presença de numerosos polimorfonucleares e dos cristais de diidrato de pirofosfato de cálcio (DDPC), dentro e fora dos leucócitos. As radiografias revelam as calcificações intra-articulares com o padrão linear ou pontilhado, sobre os meniscos e cartilagem articular.


O diagnóstico deve ser feito pelo achado dos cristais típicos sob exame microscópico com luz polarizada, associado às evidências radiológicas de condrocalcinose. Os cristais da DDPC, ao serem analisados pela microscopia óptica com luz polarizada, revelam fraca birrefringência positiva.


Os principais diagnósticos diferenciais da DDPC são a gota e a artrite séptica. Mais uma vez, devemos lembrar que os exames de gram e cultura devem ser solicitados em todo paciente com artrite monoarticular aguda. Muitas vezes a gota e a pseudogota são clinicamente indistinguíveis.


Os sintomas da osteoartrite e da doença por deposição de cristais de pirofosfato de cálcio podem ser muito semelhantes e quase sempre existem evidências radiológicas para ambas. É difícil determinar o papel exato que cada uma desempenha.


A pseudogota pode ser clinicamente diferenciada da osteoartrite por acometer articulações que não sustentam peso, como cotovelos, punhos e ombros, e pela rápida destruição articular. A pseudogota deve ser considerada quando crises intermitentes de artrite aguda ocorrem num paciente com osteoartrite.


A artrite destrutiva grave pode se assemelhar a destruição observada nas articulações neuropáticas (Charcot).


Tratamento


Deve ser feito com antiinflamatórios não esteroidais. A indometacina, 75 a 150 mg diários, costuma ser eficaz, devendo ser prescrita por uma a duas semanas. A terapia crônica com colchicina EV, na dose de 0,6 a 1,2 mg/dia pode reduzir acentuadamente a frequência das crises agudas. Eventualmente, injeções de corticoides intra-articulares podem ser necessárias.


QUESTÕES DE CONCURSOS (ARTROPATIA POR CRISTAIS)


1 – Homem de 45 anos, em uso de alopurinol há um mês, acorda à noite com dor intensa em hálux direito, cuja articulação se encontra hiperemiada e quente. Considerando-se este quadro clínico, a conduta adequada é: 
a) aumentar a dose de alopurinol 
b) iniciar AAS e suspender o alopurinol 
c) iniciar colchicina e suspender alopurinol 
d) iniciar indometacina em dose plena e manter o alopurinol * 
e) iniciar ibuprofeno em dose plena e suspender o alopurinol


2 – O mármaco cujo emprego regular em pacientes com artrite gotosa crônica sofre limitações por elevar a uricemia é: 
a) ácido tienílico 
b) sufimpirazona 
c) colchicina 
d) alopurinol 
e) furosemida*


3 – Num paciente portador de gota, a droga que pode provocar uma crise é: 
a) hidrazida 
b) penicilina 
c) rifampicina 
d) alopurinol*


4 – Num paciente com gota, hiperuricemia e hipoexcretor urinário, é contra-indicado o uso de uricosúrico na: 
a) insuficiência cardíaca 
b) hipertensão arterial 
c) litíase urinária* 
d) arteriopatia


5 – Das situações clínicas abaixo, aquela em que NÃO ocorre hiperuricemia é: 
a) diuréticos 
b) diabetes insípidos 
c) insuficiência renal 
d) insuficiência hepática*


6 – A confirmação diagnóstica da gota é feita quando há: 
a) hiperuricemia 
b) lesões em sacabocados justarticulares 
c) presença de cristais de birrefringência positiva fraca no líquido sinovial 
d) presença de cristais de binrrefringência negativa forte intraleucocitários no líquido sinovial* 
e) neutrofilia com linfopenia no líquido sinovial


7 – Dentre as evidência abaixo, a que permite caracterizar, com segurança, um episódio agudo de dor monoarticular acompanhada de sinais flogísticos como sendo artrite gotosa é: 
a) hiperuricemia maior que 8 mg/dl 
b) dor articular surgida após libação alcoólica 
c) história familiar positiva em, pelo menos, dois ancestrais 
d) presença de cristais de urato de sódio nos leucócitos do líquido sinovial* 
e) acometimento isolado da articulação metatarsofalangiana do primeiro dedo do pé


8 – Um hipertenso, portador de gota e insuficiência renal crônica avançada, é atendido com dor articular súbita e intensa na articulação metatarsofalangiana do primeiro dedo do pé, iniciada à noite. A droga de escolha para o tratamento deste quadro agudo é: 
a) colchicina 
b) alopurinol 
c) indometacina* 
d) sulfimpirazona


9 – A probenecida é uma das drogas incluídas no arsenal terapêutico da artrite gotosa crônica. O mecanismo pelo qual ela reduz a uricemia se baseia na sequinte propriedade farmacológica: 
a) bloqueio da reabsorção tubular de urato* 
b) inibição competitiva da xantino-oxidade 
c) estimulação da síntese hepática de uricase 
d) redução da transferência intestinal de purinas 
e) ativação alostérica da amidofosforribosiltransferase


10 – Com relação à artrite fotosa, podemos afirmar: 
a) não há predominância familial 
b) tem início insidioso geralmente poliarticular 
c) apresenta pouca resposta aos antiinflamatórios não hormonais 
d) na mulher, o início geralmente é pós-menopausa*


11 – Com relação à gota, podemos afirmar, EXCETO: 
a) é rara em mulher pré-menopausa 
b) apresenta resposta dramática aos antiinflamatórios não hormonais 
c) não cursa com prurido e/ou descamação pós-inflamatória* 
d) 90% da gota primária acomete homens


12 – No paciente gotoso, a incidência de cálculos renais diminui com o uso da seguinte droga: 
a) sulfimpirazona 
b) fenilbutazona 
c) acetazolamida 
d) indometacina 
e) alupurinol*


13 – Em carca de 50% dos pacientes, a primeira crise de gota ocorre na seguinte articulação: 
a) escapulo-umeral 
b) acromioclavicular 
c) metatarsofalangiana do hálux* 
d) metatarsofalangiana do 5º dedo 
e) metatarsofalangiana do polegar

14 – Num paciente do sexo masculino, portador de gota, sem tratamento, o nível sérico de ácido úrico deverá ser superior aos níveis normais. Neste caso, estará necessariamente acima de: 
a) 1,0 mg/100 ml 
b) 2,5 mg/100 ml 
c) 3,5 mg/100 ml 
d) 5,0 mg/100 ml 
e) 6,0 mg/100 ml*


15 – Na psudogota, a artrite é induzida pela presença da seguinte espécie de cristais de cálcio: 
a) pirofosfato* 
b) ortofosfato 
c) metafosfato 
d) fenilfosfato 
e) hidroxifosfato


16 – A artrite decorrente da deposição de cristais de pirofosfato de cálcio nas articulações é: 
a) gota 
b) ocronose 
c) pseudogota* 
d) reumatoide

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

Total de visualizações de página: