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domingo, 18 de setembro de 2011

Ortopedia: Hérnia de Disco - Diagnóstico e Tratamento

Ari Stiel Radu


A hérnia de disco pode ser definida como um processo contínuo de degeneração discal que leva à migração do núcleo pulposo além dos limites fisiológicos do ânulo fibroso.

Trata-se de uma situação relativamente freqüente, acometendo cerca de 0,5 a 1,0 % da população, principalmente entre os 20-60 anos de idade, com discreta predominância do sexo masculino.

A hérnia discal é a causa da dor em cerca de 1% das lombalgias. Embora seja uma doença de diagnóstico relativamente fácil, existem alguns erros conceituais extremamente comuns que constituem verdadeiras armadilhas na abordagem diagnóstica e terapêutica.

O diagnóstico das hérnias discais é essencialmente clínico. Uma anamnese bem orientada associada a um bom exame físico é tudo que o clínico precisa para fazer um diagnóstico correto na maioria das vezes. A prepedêutica armada pode ser um instrumento auxiliar em situações específicas mas pode também ser um elemento de confusão, levando a diagnósticos incorretos.

Nesse sentido, a anamnese representa o principal elemento no diagnóstico diferencial das hérnias. Tipicamente, a hérnia discal leva a um quadro agudo do relacionado com um fator desencadeante mecânico, particularmente nas hérnias lombares. A dor da hérnia discal lombar piora com a flexão do tronco e a manobra de valsalva. Apesar de ser bastante intensa no início do quadro, a dor mantém um caráter mecânico. Muitas vezes existe uma história pregressa de crises de lombalgia ou mesmo lombociatalgias recidivantes. A dor lombar costuma ser intensa e associada com uma dor no membro inferior, quase sempre unilateral e com trajeto característico, dependendo da raiz comprometida. Da mesma forma, nas hérnias cervicais, a dor cervical vem acompanhada da braquialgia com trajeto específico. Além da dor, frequentemente os pacientes se queixam de diferentes graus de parestesias na região acometida. Em alguns casos, alterações específicas de motricidade, sensibilidade e/ou reflexos podem estar presentes, porém um déficit motor maior é raro. Mesmo assim, alguns casos podem evoluir com pé-caído ou mesmo com uma síndrome da cauda eqüina, que representaria uma urgência cirúrgica. Neste sentido, além de um exame neurológico habitual, é preciso sempre verificar se existe uma alteração na sensibilidade perineal e no funcionamento dos esfíncteres.

Este conjunto de alterações é mais ou menos específico para cada raiz nervosa, de forma que com base nas alterações neurológicas é possível estabelecer o nível de lesão. Mais importante ainda, essas alterações permitem diferenciar o acometimento de uma raiz nervosa de outras causas de dor lombar irradiada para membro inferior ou cervicalgia irradiada para membros superiores.

O exame físico deve sempre incluir um exame geral para diagnóstico de patologias associadas ou mesmo de causas sistêmicas de dor referida na região lombar / cervical que possam estar sendo diagnosticadas como hérnia. Mais freqüente ainda é a presença de doenças articulares ou periarticulares periféricas, mimetizando um quadro de radiculalgia. Um exemplo típico é a patologia de quadril, imitando uma lombo-ciatalgia ou a patologia de ombro imitando uma cérvico-braquialgia.

O exame físico deve ser feito com o paciente despido, incluindo então um exame dermatológico. Inicialmente a coluna é examinada globalmente e só depois cada segmento da coluna é examinado em separado. Tipicamente, nos casos de hérnia discal existe uma grande contratura muscular paravertebral lombar ou cervical associada a posições antálgicas. Nas hérnias lombares a dor limita a marcha. A pesquisa da mobilidade da coluna revela grande limitação principalmente da flexão da coluna. Na região lombar essa limitação pode ser comprovada pelo teste de Schober. A palpação da região paravertebral é dolorosa, bem como a palpação da linha mediana sobre o plano dos espaços discais acometidos. Às vezes, a palpação do espaço discal acometido pode levar ao sinal-da-campainha, com irradiação da dor pelo membro.

O exame neurológico é obrigatório, incluindo sensibilidade, motricidade e alterações de reflexos, visando a estabelecer um nível radicular específico. No caso de hérnias lombares, o teste de Lasègue é um indicador sensível de uma compressão radicular.

Na maioria das vezes, a anamnese e o exame físico são muito sugestivos de uma hérnia discal, mesmo antes da confirmação radiológica. No entanto, alguns sinais são considerados sinais de alerta que exigem uma conduta diagnóstica mais aprofundada e, muitas vezes, uma terapia mais agressiva. São considerados fatores de alerta a presença de febre, perda de peso e dor noturna. Casos de hérnia paralisante ou de síndrome da causa eqüina são considerados emergências cirúrgicas. Finalmente, uma má resposta à terapia inicial também indica uma investigação mais aprofundada.

A eletroneuromiografia é um exame de pouca utilizada prática em casos de hérnia discal clássica. Além de ser um exame com baixa sensibilidade e baixa especificidade, trata-se de um exame muito dependente da técnica do examinador.

Mesmo assim, alguns casos específicos, particularmente quando se desconfia da organicidade dos sintomas, podem se beneficiar desse estudo.

A investigação radiológica pode incluir o Raio X simples, a tomografia computadorizada, a ressonância magnética, a mielografia e a mielo-tomografia. Cada um desses exames tem suas vantagens e desvantagens, devendo sua indicação ser avaliada em cada caso.

O Raio X simples como exame inicial permite apenas avaliar a presença de alterações degenerativas associadas, como degeneração discal, artrose facetaria, espondilolistese, etc. Eventualmente, lesões ósseas mais proeminentes podem ser diagnosticadas ao Raio X simples. A visualização da hérnia é melhor apreciada pela tomografia computadorizada e pela ressonância magnética. No entanto, muito embora sejam exames sensíveis para a detecção de hérnias discais, estes exames são altamente inespecíficos. Acredita-se que até 30% de indivíduos assintomáticos podem apresentar sinais de hérnias discais nesses exames, sem qualquer significado clínico. Além do mais, a presença de protrusões discais é ainda mais freqüente e, na maioria das vezes, representam apenas um achado radiológico sem maior significado.

Daquilo que foi dito acima, conclui-se que o diagnóstico das hérnias discais deve ser eminentemente clínico. O diagnóstico NUNCA deve se basear em achados de exames de imagens que não correspondam com um quadro clínico apropriado. Por exemplo, a presença de lombalgia isolada sem dor no membro ou a presença de dor no membro com trajeto diferente ao esperado pela raiz comprimida ao exame de imagem são achados difíceis de atribuir às alterações do exame.

Nesse sentido, é importante pensar no extenso diagnóstico diferencial das hérnias discais.

Em primeiro lugar, é preciso lembrar das dores referidas e das pseudo-radiculalgias.

Posteriormente, é preciso lembrar das causas neurológicas não radiculares, como compressões tronculares e neuropatias periféricas. Finalmente, além da hérnia discal, existem outras causas possíveis de compressão radicular que devem ser afastadas.

Uma vez estabelecido o diagnóstico de hérnia discal, o tratamento deve ser precoce.

A imensa maioria das hérnias discais evolui para cura em 8-12 semanas sem qualquer relação com uma melhora radiológica. Portanto, volto a insistir na necessidade de nunca tratar a imagem da hérnia mais sim os seus sintomas. O tratamento inicial é conservador, exceto nas raras situações de hérnia paralisante e síndrome da cauda eqüina.

No início, o repouso está indicado, porém não deve ser encorajado ao extremo. A própria dor obriga o paciente a um repouso relativo, que não deve exceder 7-10 dias. A seguir, o paciente deve ser encorajado a voltar a suas atividades lentamente, exceto no contexto profissional e esportivo, onde atividades fisicamente mais intensas, particularmente aquelas que envolvam levantamento de peso e flexão da coluna, devem ser evitadas por um período mais prolongado (30-45 dias).

O tratamento medicamentoso inclui analgésicos, antiinflamatórios e miorrelaxantes. É importante que se consiga uma analgesia eficiente logo no início do tratamento. Da mesma forma, os conhecimentos atuais da fisiopatologia da hérnia discal indicam um tratamento antiinflamatório potente logo de início. Nesse sentido, além de AINHs em dose plena, o tratamento pode incluir corticosteróides em doses repressivas por curto período. O uso de corticosteróides por via intradural permite uma maior concentração de corticóide local sem os efeitos sistêmicos indesejáveis. Sua utilização pode levar a um alívio sintomático mais rápido, muito embora não tenha papel na evolução final do quadro.

Na fase inicial da doença deve-se evitar qualquer tipo de manipulação e o papel da fisioterapia se limita a medidas analgésicas e de relaxamento muscular. Com a melhora dos sintomas, a reabilitação deve ser progressivamente indicada, no sentido de evitar novas crises através de exercícios de alongamento e fortalecimento muscular.

O uso de coletes abdominais ou cervicais deve ser restringido aos primeiros dias da doença, caso o paciente se sinta mais confortável ou seguro, porém seu uso deve ser limitado aos períodos de movimento e não deve ultrapassar alguns dias apenas.

A cirurgia raramente é indicada em casos de hérnia discal. As indicações absolutas são a presença de síndrome de cauda eqüina e a progressão de uma lesão neurológica.

A má resposta ao tratamento adequado após cerca de 8 semanas também é um fator de indicação cirúrgica. Finalmente, alguns casos evoluem de forma hiperálgica persistente, os quais podem ter uma indicação cirúrgica mais precoce.

Concluindo, o diagnóstico das hérnias discais é clinico. O raciocínio começa com o reconhecimento anatômico da raiz nervosa acometida. Uma ver confirmada a suspeita de hérnia discal, a ausência de sinais de alerta ou de urgência cirúrgica indicam o tratamento conservador. O tratamento deve se buscar nos sintomas e nunca nas imagens.

ALGUNS TÓPICOS DA HÉRNIA DISCAL LOMBAR

EPIDEMIOLOGIA

. 0,5% a 1 % da população entre 2- a 60 anos
. 1 % das lombalgias
. População masculina > feminina

ANAMNESE

. Piora com a manobra de valsalva
. Dor de caráter mecânico
. Antecedentes de crises de lombalgia / ciatalgia

SINAIS DE ALERTA

. Febre
. Perda de peso
. Dor noturna

RAIO X SIMPLES

. Inespecífico
. Altura do disco
. Lesões ósseas
. Alterações degenerativas
. Espondilolistese

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

. Doenças sistêmicas
. Radiculopatias não discais
. Pseudo-radiculalgia:
O- Coxopatia
O- Bursite trocantérica
O- Tendinite do glúteo médio
O- Artropatia do joelho
O- Tendinite aquileana
O- Sacroileíte
. Ciáticas tronculares
. Neuropatia periférica
. Compressão nervosa
. Ciáticas cordonais

CAUSAS DE SOFRIMENTO RADICULAR

. Conflito disco-radicular
. Canal estreito
. Cisto articular posterior
. Artrose articular posterior
. Espondilolistese
. Anomalias do fundo de saco dural
. Fraturas vertebrais
. Síndrome pós-laminectomia
. Metástases e tumores
. Infecções
. Meningo-radiculites
. Hematomas
. Trauma

HÉRNIA DISCAL – TRATAMENTO

. Repouso – mobilização
. Analgésicos
. AINH
. Miorrelaxantes
. Colete?
. Corticóide?
. Infiltrações?


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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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