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quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Psiquiatria: Transtorno Bipolar - Diagnóstico e Tratamento

José Alberto Del Porto

Definição

O transtorno bipolar do humor caracteriza-se pela ocorrência de episódios de mania (exaltação do humor, euforia, hiperatividade, loquacidade exagerada, diminuição da necessidade de sono, exacerbação da sexualidade e comprometimento da crítica), comumente alternados com períodos de depressão e de normalidade. Com certa freqüência, os episódios maníacos incluem também irritabilidade, agressividade e incapacidade de controlar adequadamente os impulsos.

As fases maníacas caracteriza-se ainda pela aceleração do pensamento (sensação de que os pensamentos estão fluindo mais rapidamente), distraibilidade e incapacidade de dirigir a atividade para metas definidas (embora haja aumento da atividade, a pessoa não consegue ordenar as ações de forma a alcançar objetivos precisos). Quando em seu quadro típico, as fases maníacas prejudicam ou impedem o desempenho profissional e as atividades sociais, não raramente expondo os pacientes a situações embaraçosas e a riscos variados (dirigir sem cuidado, fazer gastos excessivos, indiscrições sexuais, etc.). Em casos mais graves, o paciente pode apresentar delírios de grandeza ou de poder, acompanhando a exaltação do humor; delírios de perseguição, entre outros e, ainda, alucinações, embora mais raramente. Nesses casos, muitas vezes o quadro clínico é confundido com a esquizofrenia.

O diagnóstico diferencial deve ser feito com base na história pessoal (na doença bipolar, os quadros são agudos e seguidos por períodos de depressão ou de remissão) e familiar (com certa freqüência, podem ser identificados quadro de mania e depressão na família).

Nos últimos anos, tem-se reconhecido a importância dos quadros de hipomania (mania mitigada, que não se apresenta com a gravidade da mania propriamente dita). Os quadros caracterizados por hipomania e pela ocorrência de episódios depressivos maiores têm sido chamados de transtorno bipolar II. O reconhecimento desses quadros é importante, visto que o uso de antidepressivos pode agravar seu curso, assim como também ocorre na doença bipolar com fases maníacas típicas (tipo I).

No transtorno bipolar (tipos I e II) são recomendados estabilizadores do humor e nas fases mais agudas, neurolépticos atípicos (como olanzapina ou risperidona) ou até mesmo, por razões práticas, neurolépticos clássicos (como halperidol ou clorpromazina), levando-se em consideração o perfil de efeitos colaterais destes últimos.

Epidemiologia

Estudos epidemiológicos (como o National Comorbidity Survey, nos Estados Unidos) indicam que o transtorno bipolar é relativamente freqüente (prevalência de 1,6% para o tipo I, e de 0,5% para o tipo II). A idade média de início dos quadros bipolares é de 20 e poucos anos, embora alguns casos se iniciem ainda na adolescência e outros, apenas mais tardiamente (após os 50 anos).

Os episódios maníacos costumam ter início súbito, com rápida progressão dos sintomas: frequentemente, os primeiros episódios ocorrem associados a estressores psicossociais. Com a evolução da doença, os episódios podem se tornar mais freqüentes e os intervalos livres, se encurtar. Para algumas mulheres, o primeiro episódio maníaco pode acontecer no período puerperal.

Diagnóstico Diferencial

Deve-se ter em mente o diagnóstico diferencial com os seguintes quadros: esquizofrenia, psicoses esquizoafetivas, psicoses ciclóides, quadros orgânicos cerebrais (incluem-se aqui esclerose múltipla, quadros demenciais, sífilis e AIDS, além de certas formas de epilepsia), quadros associados a condições clínicas gerais (Cushing, hipertireoidismo, etc.) e ao uso de drogas (anfetaminas, cocaína, etc.) e síndromes desencadeadas por medicamentos (corticosteróides, antidepressivos, etc.).

Os quadros mais leves (de tipo II) são muitas vezes classificados erroneamente como transtornos de personalidade (mais frequentemente o transtorno borderline de personalidade) e, assim, permanecem sem tratamento específifco. Deve-se mencionar também que o abuso/dependência de drogas e álcool é muito mais comum em pacientes bipolares (odds ratio = 7,9) que na população geral.

Tratamento

Sais de Lítio:

Cinqüenta anos depois de sua introdução na prática psiquiátrica, os sais de lítio permanecem como o tratamento de escolha para a maioria dos casos de mania aguda e para a profilaxia de recorrência das fases maníaco-depressivas.

Na mania aguda, a eficácia do lítio situa-se, conforme o tipo de paciente, entre 49% (estudo de apensas três semanas, incluindo casos anteriormente resistentes) e 80% dos casos, mostrando-se mais eficiente que os neurolépticos na redução dos principais sintomas da mania (exaltação do humor, aceleração do pensamento e idéias de grandiosidade); em contraposição, os neurolépticos mostram-se mais rápidos e eficazes no controle da hiperatividade e da agitação psicomotora, sugerindo que sua ação se deva a uma sedação mais inespecífica.

Numerosos estudos controlados confirmam a eficácia do lítio na profilaxia de ambas as fases (maníacas e depressivas) do transtorno bipolar, nas manias típicas, assim como os episódios de mania seguidos por eutimia e depressão (M-E-D). Os pacientes com mania mista (mesclada com sintomas depressivos) e mania disfórica (com acentuada irritabilidade) e os cicladores rápidos (aqueles com mais de quadro ciclos em um ano) não respondem tão bem ao lítio; para eles, o divalproex (ácido valpróico/valproato) e a carbamazepina podem se constituir em melhor indicação (ver a seguir).

Levando-se em conta a estreita faixa terapêutica, assim como as variações na taxa de excreção do lítio, recomenda-se a monitoração periódica de seus níveis séricos, mais frequentemente no início do tratamento, quando as doses forem alteradas ou a qualquer momento, desde que haja indícios ou suspeita de intoxicação pelo lítio.

A dosagem do lítio deve ser feita sempre 12 horas após a última ingestão do comprimido de lítio. Em geral, dosam-se os níveis séricos de 5 a 7 dias após o início (quando o lírio atinge seu steady state); depois a cada 7 ou 14 dias de tratamento; passando-se a fazer o controle a cada 2 ou 3 meses nos primeiros 6 meses e, depois, a cada 4 ou, no mínimo, 6 meses.

Os níveis recomendados para o tratamento situam-se entre 0,6 e 1,2 mEq/L. A dose mais alta (1,2 mEq/L) é reservada para os estados agudos; para a manutenção, doses entre 0,6 e 0,8 mEq/L são geralmente suficientes, procurando-se manter o paciente com as menores doses necessárias para a profilaxia (alguns pacientes se dão bem com 0,4 mEq/L, e outros, eventualmente, precisam de doses maiores que 0,8 mEq/L). Em geral, inicia-se o tratamento com 300 mg à noite, aumentando-se as doses gradativamente até se alcançarem os níveis séricos desejados, levando-se em conta a tolerabilidade do paciente aos efeitos colaterais. A dosagem dos hormônios tireoidianos deve ser feita a cada 6 ou 12 meses, assim como a monitoração da função renal.

O carbonato de lítio está disponível em comprimidos (Carbolitium) de 300 mg e em preparados de liberação lenta (Carbolitium CR) de 450 mg. Os preparados convencionais têm seu nível sérico máximo alcançado dentro de 1 hora e meia a 2 horas; os preparados de liberação lenta alcançam seu pico dentro de 4 a 4 horas e meia. O lítio é excretado quase que totalmente pelos rins, com meia-vida entre 14 e 30 horas. As preparações convencionais podem ser administradas 2 vezes/dia, e as de liberaão lenta podem ser utilizadas em dose única (nestes casos, os níveis séricos matinais estarão aumentados em até 30%), geralmente à noite; usando-se doses maiores, mesmo o preparado de liberação lenta é mais comumente utilizado 2 vezes/dia.

Antes de iniciar o tratamento, o paciente deve ser avaliado por meio de um exame físico geral e exames laboratoriais que incluem: hemograma completo, eletrólitos (Na+, K+), avaliação da função renal (uréia, creatinina, exame de urina tipo I) e da função tireoidiana (T3, T4 e TSH). Em pacientes com mais de 40 anos, ou com antecedentes de doença cardíaca, recomenda-se solicitar um eletrocardiograma (depressão do nó sinusal e a alterações da onda T podem surgir em decorrência do lítio, e é conveniente obter-se um traçado inicial, para comparação posterior). Como o lítio frequentemente acarreta polidipsia e poliúria (por antagonizar os efeitos do hormônio anti-diurético), deve-se também solicitar uma dosagem da glicemia antes de sua introdução. Algumas vezes, o diabetes mellitus pode passar desapercebido e o psiquiatra pode achar que a polidipsia e a poliúria devem-se exclusivamente ao esperado diabetes insipidus produzido pelo lítio, quando, na verdade, o diabetes mellitus está presente.

As queixas relativas aos efeitos colaterais mais comuns são: sede e poliúria, problemas de memória, tremores, ganho de peso, sonolência/cansaço e diarréia. No início do tratamento são comuns azia, náuseas, fezes amolecidas, sensação de peso nas pernas e cansaço, mas esses sintomas desaparecem com o tempo. Diarréia e tremores grosseiros podem indicar intoxicação se ocorrerem tardiamente no curso do tratamento e requerem avaliação imediata.

Dentre os efeitos colaterais tardios do lítio, aqueles sobre a tireóide merecem particular atenção. O desenvolvimento de um hipotireoidismo clinicamente significativo ocorre em até 5% dos pacientes (em alguns casos, chegando a bócio), enquanto elevações do TSH chegam a 30%. Muitas vezes, a complementação com hormônios da tireóide (mais comumente T4) torna desnecessária a interrupção do uso do lítio, mas, eventualmente o médico precisará mudar para outro estabilizador do humor.

O lítio pode aumentar os níveis séricos do cálcio e pode ocorrer a associação com anormalidades da paratireóide, embora isso seja mais raro. Outros efeitos são: edema, acne, agravamento de psoríase, tremores (tratados com betabloqueadores) e ganho de peso (25% dos pacientes tornam-se obesos, razão pela qual nunca é demais insistir precocemente em cuidados relativos a dieta e exercícios).

Cumpre notar ainda que o lítio pode diminuir o limiar convulsígeno e, em alguns casos, causar ataxia, fala pastosa e síndrome extrapiramidal (particularmente em idosos).

Os efeitos renais do lítio incluem aumento da diurese, conseqüente á diminuição da capacidade de concentração da urina, por oposição à ação do hormônio antidiurético (ADH); fala-se em diabetes insipidus quando os pacientes produzem mais de 3 litros de urina por dia.

O lítio pode causar nefrite intersticial, que normalmente não tem importância clínica. As alterações cardíacas são geralmente benignas e incluem achatamento ou possível inversão da onda T, diminuição da freqüência cardíaca e, raramente, arritmias. Casos isolados de disfunção do nó sinusal têm sido descritos e eventualmente podem ocasionar síncope, principalmente em idosos. Uma leucocitose pode se desenvolver, embora não seja, em geral, motivo de preocupação.

Efeitos teratogênicos (anomalias da tricúspide e dos vasos da base) têm sido associados ao uso de lítio, particularmente no primeiro trimestre de gravidez; o uso do lítio no final da gravidez pode fazer com que o bebê nasça com hipotonia (síndrome do floppy baby).

As intoxicações pelo lítio costumam ocorrer com concentrações séricas acima de 1,5 mEq/L e podem ser precipitadas por desidratação, dietas hipossódicas, ingestão excessiva de lítio, alterações na excreção renal ou interação com outros medicamentos que aumentam seus níveis séricos (antiinflamatórios, diuréticos, etc.).

Constituem-se em sinais e sintomas da intoxicação pelo lítio: sonolência, fasciculações musculares, tremores mais grosseiros, hiper-reflexia, ataxia, visão turva, fala pastosa, arritmias cardíacas e convulsões. Recomenda-se uma cuidadosa monitoração dos níveis séricos. Em casos leves, basta a manutenção do equilíbrio hidreletrolítico, podendo-se forçar a diurese com manitol e alcalinizar a urina. A diálise pode ser requerida em intoxicações mais graves (níveis séricos acima de 4 mEq/L) ou dependendo do estado geral e da função renal do paciente.

As seguintes interações farmacológicas podem aumentar os níveis séricos de lítio: carbamazepina, diuréticos (tiazídicos, inibidores da enzima conversora ou antagonistas da aldosterona) e antiinflamatórios não-esteróides (ibuprofeno, diclofenaco, indometacina, naproxen, fenilbutazona, sulindac). Os neurolépticos podem potencializar o aparecimento de síndrome extrapiramidal e, em casos mais raros, com litemias mais elevadas, desenvolver síndrome cerebral orgânica, quando em doses mais altas (principalmente os neurolépticos de alta potência, como o haloperidol). Os antiarrítmicos, principalmente os de tipo quinidínico, podem potencializar os efeitos sobre a condução cardíaca.

Cumpre notar que o uso de antidepressivos (em especial os tricíclicos) concomitantemente ao uso de lítio pode causar mudança para a fase maníaca em pacientes bipolares, além de poder favorecer o aparecimento de ciclos rápidos e de episódios mistos. O tratamento da depressão nos pacientes bipolares deve ser tentado antes com estabilizadores do humor, empregando-se eventualmente também bupropiona ou IMAOs (com os cuidados necessários para esse grupo de pacientes) ou ainda ECT, no caso de pacientes resistentes aos tratamentos habituais (retirando-se previamente o lítio).

Anticonvulsivantes:

O valproato, ou o divalproex (um composto que contém proporções iguais de ácido valpróico e valproato de sódio), tem sido amplamente utilizado, nos últimos anos, para o tratamento do transtorno bipolar. Existem estudos controlados que mostram sua eficácia no tratamento da mania aguda; há também dados que indicam que o valproato pode ser mais eficaz que o lítio para o tratamento da mania mista e dos cicladores rápidos. Embora faltem estudos controlados sobre o uso do valproato na manutenção, existem estudos abertos e naturalísticos que apontam sua eficácia na profilaxia da mania e da depressão. Há menos evidências que sustentem o uso do valproato no tratamento da depressão bipolar, embora alguns estudos sugiram certa eficácia.

O valproato e o divalproex podem ser combinados com o lítio e, respeitando-se as interações farmacocinéticas, também com a carbamazepina, no caso de pacientes resistentes à monoterapia. Os efeitos colaterais do valproato incluem sedação, perturbações gastrintestinais, náuseas, vômitos, diarréias, elevação benigna das transaminases e tremores. Também pode ocorrer leucopenia assintomática e trombocitopenia. Outros efeitos incluem queda de cabelo (às vezes acentuada) e aumento do peso e do apetite. Em alguns casos, a leucopenia pode ser grave e acarretar a interrupção do tratamento. Efeitos idiossincráticos incluem o desenvolvimento de ovários policísticos e hiperandrogenismo. Casos de morte, embora raros, têm sido descritos devido a hipatotoxidade, pancreatite e agranulocitose. Os pacientes ou seus responsáveis devem ser advertidos sobre os sinais e os sintomas precoces dessas raras complicações. A intoxicação com doses excessivas requer hemodiálise, além de medidas de suporte e, às vezes, de naltrexone.

O tratamento com valproato deve ser iniciado com doses baixas (250 mg/dia), titulando-se a dose em aumentos graduais de 250 mg com espaço de alguns dias, até atingir a concentração sérica de 50 a 100 ug/mL (não se excedendo a dose de 60 mg/kg por dia). Controles dos níveis séricos, do hemograma e das enzimas hepáticas são requeridos. Os níveis séricos do valproato podem ser diminuídos pela carbamazepina e aumentados por drogas como a fluoxetina. O valproato aumenta os níveis séricos do fenobarbital, da fentoína e dos tricíclicos. A aspirina desloca o valproato de sua ligação às proteínas, aumentando sua fração livre.

A carbamazepina tem sido utilizada no tratamento do transtorno bipolar desde a década de 1970; estudos controlados sugerem uma taxa de resposta, na mania aguda, em torno de 61%. A carbamazepina tem sido pouco estudada no tratamento da depressão bipolar, embora alguns estudos dêem suporte à sua utilização. Quatorze estudos controlados (ou parcialmente controlados) sugerem que ela possa ser eficaz na profilaxia da doença bipolar, em que pesem algumas limitações metodológicas.

Embora os níveis plasmáticos eficazes difiram muito entre os indivíduos, em geral preconizam-se níveis entre 4 e 12 ug/mL. Como a carbamazepina induz ao aumento do seu próprio metabolismo, suas doses devem ser ajustadas depois de algum tempo para que os seus níveis no sangue sejam mantidos. Deve-se lembrar que a indução de enzimas hepáticas pela carbamazepina reduz os níveis de várias outras substâncias (como os hormônios tireoidianos) e medicamentos (entre os quais os anticoncepcionais, cujas doses devem ser reajustadas, em acordo com o ginecologista).

Entre os efeitos colaterais da carbamazepina estão: diplopia, visão borrada, fadiga, náusea e ataxia. Esses efeitos geralmente são transitórios, melhorando com o tempo e/ou redução da dose. Menos frequentemente, observam-se rash cutâneo, leucopenia leve, trombocitopenia leve, hipoosmolaridade e leve elevação das enzimas hepáticas (em 55 a 15% dos pacientes). Caso os níveis de leucopenia e a elevação das enzimas hepáticas se agravem, o tratamento deve ser interrompido. a hiponatremia deve-se à retenção de água causada pelo efeito antidiurético da carbamazepina; mais comum nos idosos, essa condição às vezes leva à necessidade de interromper o uso desse medicamento. A carbamazepina também pode diminuir os níveis de tiroxina e elevar os de cortisol; no entanto, esses efeitos raramente são clinicamente significativos. Efeitos rqaros, mas potencialmente fatais incluem: agranulocitose, anemia aplásica, dermatite esfoliativa (p.ex., Stevens-Johnson) e pancreatite. Os pacientes devem ser alertados sobre os sinais e sintomas que precocemente fazem suspeitar dessa condições. Muito raramente pode ocorrer insuficiência renal e alterações da condução cardíaca.

Os cuidados prévios à introdução da carbamazepina incluem, além da anamnese a respeito de história prévia de discrasias sanguíneas e doença hepática, hemograma completo, enzimas hepáticas, bilirrubinas, fosfatase alcalina, eletrólitos (dado o risco de ocorrer hiponatremia) e avaliação da função renal. As doses devem ser pequenas inicialmente (100 a 200 mg/dia) e devem ser aumentadas gradualmente até atingir níveis séricos compatíveis ou melhora terapêutica. Além disso, elas devem ser divididas em três ou quatro vezes diárias, aumentando-se o intervalo para as preparações de liberação lenta. Doses superiores a 1200 mg/dia não são normalmente recomendadas. Inicialmente, monitoram-se o hemograma e a função hepática a cada 2 semanas, nos primeiros 2 meses, espaçando-se depois os controles para cada 3 meses.

Muitas das condições descritas não são previstas nos exames, por isso os pacientes devem ser instruídos a relatar os sintomas precoces de cada condição potencialmente perigosa (leucopenia, quadros alérgicos, icterícia, etc.).

Novos anticonvulsivantes têm sido testados para tratar o transtorno bipolar, como a oxcarbazepina, a lamotrigina, a gabapentina e o topiramato. Ainda não existem muitos estudos controlados com esses medicamentos, o que faz com que eles sejam empregados com cautela e para casos resistentes aos tratamentos já estabelecidos.

A oxcarbazepina é o 10-ceto análogo da carbamazepina que, em contraste a esta, não induz ao aumento do metabolismo oxidativo hepático. Aparentemente, a oxcarbazepina causa menos sedação e rash cutâneo que a carbamazepina, assim como também não eleva as enzimas hepáticas na mesma freqüência. alguns estudos controlados indicam a eficácia da excarbazepina na mania aguda, podendo eventualmente substituir a carbamazepina quando esta não for bem tolerada; faltam, no entanto, estudos referentes à depressão e à profilaxia do transtorno bipolar. As doses utilizadas, em diferentes estudos, têm variado entre 600 a 2400 mg/dia, administradas 2 ou 3 vezes/dia, com aumento gradual de doses.

A lamotrigina é um anticonvulsivante da classe da feniltriazina, que tem se mostrado eficaz no tratamento do transtorno bipolar, incluindo os estados mistos e os cicladores rápidos de tipo II (Calabrese, 2000). De especial importância reveste-se o estudo randomizado e controlado, realizado por Calabrese ET AL. (1999), que mostrou a eficácia da lamotrigina no tratamento da depressão bipolar. Seus efeitos colaterais incluem: tonturas, ataxia, sonolência, cefaléia, diplopia, náuseas, vômitos e rach cutâneo. A lamotrigina pode reduzir a concentração do ácido fólico, o que, por sua vez, tem sido relacionado à teratogênese; por essa razão, a lamotrigina não deve ser usada durante a gestação. Os autores advertem a respeito do risco de ocorrer rach cutâneo, que pode ser grave, e alertam para a possibilidade, embora mais rara, de desenvolvimento da síndrome de Stevens-Johnson.

Recomenda-se iniciar o tratamento com lamotrigina em doses baixas: 25 mg/dia por 1 semana, seguida de 50 mg/dia por mais 2 semanas; se necessário, aumentar a dose, depois de mais 2 semanas, para 100 mg por dia, em duas vezes diárias; posteriormente, pode-se aumentar a dose em 50 a 100 mg a cada 1 ou 2 semanas. Em geral, usam-se doses diárias de 50 a 250 mg/dia. Caso o paciente esteja usando ácido valpróico, as doses devem ser reduzidas à metade, sendo a titulação da dose iniciada com 25 mg a cada 2 semanas; a associação com ácido valpróico aumenta o risco de ocorrer rash cutâneo. Caso haja associação com carbamazepina, as doses devem ser duplicadas, em função da indução enzimática.

A gabapentina não sofre metabolização no organismo humano, sendo eliminada pelos rins praticamente inalterada. Não interage, por isso, com o sistema do citocromo P450, sendo praticamente destituída de interações farmacológicas. Seus efeitos colaterais mais comuns são: sonolência, tonturas, ataxia, fadiga e nistagmos. As doses terapêuticas usuais situam-se entre 900 e 1800 mg/dia, divididas em três vezes. Inicia-se o tratamento com 300 mg, administrados geralmente à noite, devido à sonolência que essa substância acarreta, aumentando-se gradualmente as doses, em 300 mg/dia, a cada 3 ou 4 dias, dependendo da tolerabilidade do paciente. Embora haja muitos estudos abertos e naturalísticos, ainda faltam estudos prospectivos, randomizados, que confirmem a eficácia da gabapentina, em monoterapia, no tratamento do transtorno bipolar.

O topiramato tem sido, mais recentemente, testado no tratamento do transtorno bipolar. Seus efeitos colaterais incluem: perda de peso, redução do apetite, náuseas, parestesias, sonolência, tonturas e cansaço. Em monoterapia, o topiramato mostrou-se útil em cinco de onze pacientes com mania refratária, em doses de 50 a 1300 mg/dia (as doses usuais não ultrapassam 200 a 300 mg por dia); em associação com outras drogas, tem se mostrado útil também no tratamento de depressão bipolar, mania, hipomania e estados mistos. Aguardam-se estudos prospectivos, controlados, com número maior de pacientes.

Neurolépticos:

Há muito tempo os neurolépticos clássicos têm sido utilizados no tratamento da mania aguda devido à rapidez da ação e ao controle da agitação psicomotora. No entanto, seu uso no tratamento de manutenção tem sido evitado por causa dos efeitos colaterais (parkinsonismo, acatisia, e risco de desenvolvimento de discinesia tardia), além do fato de poder desencadear ou agravar quadros depressivos.

Neurolépticos atípicos, como a clozapina, têm sido usados como estabilizadores do humor em quadros resistentes. A clozapina, no entanto, tem seu uso limitado devido ao risco de provocar agranulocitose. A risperidona e a olanzapina também têm sido utilizadas no tratamento da mania aguda; a olanzapina começa a ser testada como estabilizadora do humor.

A olanzapina, em pesquisa randomizada e controlada com placebo, mostrou-se eficaz no controle da mania aguda, e está sendo estudada como estabilizadora do humor.

Outros Agentes:

Bloqueadores dos canais de cálcio, clonidina e estimulação magnética transcraniana de repetição (rTMS) têm sido utilizados no tratamento do transtorno bipolar; seu uso ainda é experimental e limitado a casos resistentes a outras drogas. O clonazepam é mais frequentemente usado como coadjuvante, nos casos de agitação e insônia.

Eletroconvulsoterapia:

A eletroconvulsoterapia conserva lugar de destaque no tratamento dos casos resistentes, mostrando ação antidepressiva, antimaníaca e estabilizadora do humor. Em casos refratários, ela chega a ser utilizada, dentro de certos limites, até como tratamento de manutenção (em aplicações mensais). A eletroconvulsoterapia sempre deve ser realizada com relaxantes musculares (geralmente, a succinilcolina), anestesia e oxigenação; além da oximetria, deve-se monitorizar o EEG e o ECG. Recomenda-se que a eletroconvulsoterapia seja feita com corrente de pulsos breves (onda quadrada) e aplicada somente por médicos com treinamento especializado.


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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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