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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Psiquiatria: Transtornos Ansiosos

Raquel Jales Leitão
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Introdução: É muito importante que os clínicos gerais estejam preparados para identificar pacientes com transtornos ansiosos, uma vez que esses quadros são muito frequentes na comunidade, provocam grande demanda nos serviços de saúde e podem dificultar a recuperação de outra condição clínica presente.
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Quadro Clínico: Define-se ansiedade como um estado de humor desconfortável, uma apreensão negativa em relação ao futuro ou uma inquietação interna desagradável. Ela pode ser considerada normal ou patológica, sendo esta uma decisão subjetiva do médico, que deve avaliar a intensidade, a duração, a frequência e o prejuízo causado na vida do paciente. Os sinais e os sintomas associados estão relacionados na Tabela2.1.
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Tabela 2.1 - SINAIS E SINTOMAS DE ANSIEDADE
Somáticos:
. Autonômicos: Taquicardia, Vasoconstrição, Sudorese, Aumento do peristaltismo, Náusea, Midríase, Piloereção.
. Musculares: Dores, Contraturas, Tremores.
. Cinestésicos: Parestesias, Calafrios, Ondas de calor, Adormecimentos.
. Respiratórios: Sufocação, Sensação de afogamento, Asfixia.
Psíquicos:
. Tensão, Nervosismo, Apreensão, Mal-estar indefinido, Insegurança, Dificuldade de concentração, Sensação de estranheza, Despersonalização, Desrealização.
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Diagnóstico Diferencial: A suspensão dos transtornos ansiosos a outras condições clínicas é muito frequente. O diagnóstico diferencial deve ser feito em condições orgânicas ou priquiátrias nas quais a ansiedade possa estar associada de forma primátia ou secundária (Tabela 2.2).
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Tabela 2.2 - DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E CONDIÇÕES CLÍNICAS QUE PODEM SE APRESENTAR COM SINAIS E SINTOMAS DE ANSIEDADE
Doenças Cardiovasculares: Anemia, Angina, Insuficiência cardíaca congestiva, Hipertensão, Prolapso da válvula mitral, Infarto do miocárdio, Taquicardia atrial paroxística.
Doenças Pulmonares: Asma, Hiperventilação, Êmbolo pulmonar, Hipoxia, Doenças obstrutivas crônicas.
Doenças Neurológicas: Vasculopatias cerebrais, Epilepsia, Síndrome pós-concussiva, Enxaqueca, Vertigem, Esclerose múltipla, Ataque isquêmico transitório, Tumores cerebrais, Doença de Huntington, Doença de Ménière, Doença de Wilson.
Doenças Endócrinas: Doença de Addison, Síndrome carcinóide, Síndrome de Cushing, Hiperparatireoidismo, Menopausa, Feocromocitoma, Síndrome de tensão pré-menstrual.
Intoxicação por Drogas: Anfetaminas, Anticolinérgicos, Antidepressivos, Anticonvulsivantes, Corticosteróides, Cocaína, Alucinógenos, Cafeína, Nicotina, Teofilina.
Abstinência de Drogas: Álcool, Anti-hipertensivos, Opiáceos e opióides, Sedativos e hipnpoticos.
Transtornos Psiquiátricos: Depressão, Início de um surto psicótico, Uso ou abstinência de drogas (álcool, benzodiazepínicos, barbitúricos), Uso de estimulantes (cafeína, anfetaminas), Alguns transtornos de personalidade.
Outras Condições: Anafilaxia, Deficiência de vitamina B12, Distúrbios hidreletrolíticos, Intoxicação por metais pesados, Infecções sistêmicas, Lúpus eritematoso sistêmico, Artrite temporal, Uremia, Porfiria.
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Classificação e Diagnóstico dos Transtornos Ansiosos:

Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)
Este é, provavelmente, o transtorno de ansiedade mais comum entre as pessoas que comparecem a um serviço de atenção primária, sendo que a sua prevalência ao longo da vida é estimada em torno de 5%. Os sintomas se desenvolvem de forma insidiosa e geralmente na adolescência. Apresenta uma alta comorbidade com outros transtornos ansiosos e psiquiátricos.
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Diagnóstico:
1. ansiedade ou preocupação exessiva sobre diferentes circunstâncias da vida durante a maior parte dos dias, por pelo menos seis meses.
2. Dificuldade em controlar essas preocupações.
3. Nos últimos seis meses, a ansiedade e a preocupação estiveram associadas a três ou mais dos seguitnes sintomas: inquietação, irritabilidade, fadiga fácil, dificuldade de concentração, tensão muscular, distúrbios do sono.
4. O foco da ansiedade não está relacionado a outros transtornos psiquiátricos (p.ex., a preocupação não é ter um ataque de ansiedade, como ocorre nos transtornos do pânico).
5. A ansiedade causa intensa aflição ou prejuízo significativo ao indivíduo.
6. Os sintomas não estão relacionados ao uso de drogas ou outras condições médicas e não ocorrem apenas durante o curso de um outro transtorno psiquiátrico.
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Tratamento:
Psicoterapia
Pacientes com sintomas leves de ansiedade podem ser encaminhados para a psicoterapia, muitas vezes não necessitando de tratamento medicamentoso.
Orientações gerais
Praticar exercícios regulares e evitar o uso de cafeína e álcool.
Medicações
1. Antidepressivos tricíclicos: efeito observado a partir da segunda ou terceira semana de tratamento.
2. Benzodiazepínicos: devem ser usados, preferencialmente, como coadjuvantes do tratamento. Reduzir a dose ou descontinuar gradativamento a medicação após algumas semanas. Usar a menor dose eficaz no alívio da ansiedade. As medicações com meia-vida mais longa são mais fáceis de retirar. Pode ocorrer piora da ansiedade após a retirada: Alprazolam (Frontal), Diazepam (Valium, Dienpax), Lorazepam (Lorax).
3. Buspirona: menos eficaz do que as medicações anteriores. Início do efeito terapêutico após duas semanas. Não sedativa. Baixo potencial de dependência.
4. Inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRSs): embora não sejam medicações suficientemente estudadas para o tratamento do TAG, pode-se considerar o uso em doses semelhantes às administradas para o transtorno do pânico. Associar um benzodiazepínico nas primeiras semanas de tratamento (no início do tratamento, os ISRSs podem causar aumento da ansiedade).

Transtorno do Pânico
A prevalência ao longo da vida para esse transtorno é superior a 3%. Os ataques de pânico são mais frequentes nas mulheres e a incidência é maior entre a puberdade e os 35 anos.

Diagnóstico
1. Ataques de pânico recorrentes e inesperados.
2. Pelo menos um dos ataques foi seguido durante um mês (ou mais) de uma (ou mais) das seguintes características: preocupações com as implicações do ataque ou suas consequências; preocupação persistente sobre a possibilidade de ter outros ataques; mudança comportamental significativa relacionada aos ataques.
3. Os ataques de pânico não são induzidos por uso de drogas, relacionados a uma condição clínica ou mais bem explicados pela presença de um outro transtorno psiquiátrico.
4. Pelo menos quatro dos seguitnes sintomas se desenvolveram repentinamente, atingindo um pico dentro de 10 minutos, durante um dos ataques: palpitações ou ritmo cardíaco acelerado; tremor ou abalos; sensação de asfixia; náusea ou desvonforto abdominal; tontura, sensação de instabilidade, vertigem ou desmaio; desrealização (sensação de irrealidade) ou despersonalização (sentir-se distanciado de si mesmo); sudorese; sensação de falta de ar; dor ou desconforto torácico; medo de morrer; medo de perder o controle ou enlouquecer; parestesias; calafrios ou ondas de calor.

Tratamento
Medicações
1. ISRSs: são as drogas de escolha (atualmente apenas a paroxetina está aprovada pelo FDA - Food and Drug Administration - para essa indicação). Começar com a dose mínima da medicação, aumentando após a primeira semana conforme a droga seja tolerada. Orientar o paciente sobre uma possível piora dos sintomas na primeira semana do tratamento: Paroxetina (Aropax, Pondera) ou fluoxetina (Prozac, Eufor, Fluxene), Sertralina (Zoloft, Tolrest).
2. Antidepressivos tricíclicos: Imipramina (Tofranil) ou outro antidepressivo tricíclico.
3. Benzodiazepínicos: apresentam uma resposta mais rápida do que outras drogas. Podem ser usados a curto prazo como coadjuvantes dos antidepressivos se ocorrer a piora inicial dos sintomas de ansiedade. Caso o paciente não tolere o uso dos antidepressivos, os benzodiazepínicos também podem ser utilizados a longo prazo: Alprazolam (Frontal), Clnazepam (Rivotril)
4. Antidepressivos IMAO: Podem ser usados quando o paciente não responder aos antidepressivos referidos anteriormente. Consultar ou encaminhar para um psiquiatra antes de iniciar essas medicações.
Psicoterapia
Sempre que possível, orientar os pacientes a procurarem um tratamento psicoterápico.

Agorafobia
Geralmente se inicia na terceira ou quarta década de vida. É mais frequente nas mulheres, muitas vezes ocorrendo com ataques de pânico.

Diagnóstico
1. Ansiedade acerca de estar em locais ou situações de onde possa ser difícil (ou embaraçoso) escapar ou onde o auxílio pode não estar disponível, na eventualidade de ter um ataque de pânico.
2. As situações agorafóbicas são evitadas ou suportadas com acentuado sofrimento ou com ansiedade acerca de ter um ataque de pânico, ou o paciente pode necessitar de uma companhia para enfrentar tais situações.
3. A ansiedade ou esquiva agorafóbica não é mais bem explicada por um outro transtorno mental (p.ex., fobias, TOC, etc).

Tratamento
Agorafobia com ataques de pânico: As drogas de escolha são ISRSs, antidepressivos tricíclicos, benzodiazepínicos ou IMAOs (ver a seção Transtorno do Pânico).
Agorafobia sem pânico: O tratamento psicoterápico é o mais indicado. Considere encaminhar o paciente para um psiquiatra ou psicólogo.

Fobia social e específica
A fobia específica acomete cerca de 5% a 10% da população geral e a fobia social, em torno de 3%. Os sintomas aparecem na infância ou no início da vida adulta e o curso, geralmente, é crônico. Fobias específicas são mais comuns nas mulheres e geralmente acarretam pouco prejuízo funcional.

Diagnóstico
1. Medo acentuado e persistente de passar por situações embaraçosas ou humilhantes em certos contextos sociais (fobia social) ou medo irracional de outro estímulo específico, p.ex., animais, sangue, altura, etc., (fobia específica).
2. A exposição ao estímulo ou à situação temida provoca ansiedade, podendo assumir a forma de um ataque de pânico.
3. A pessoa geralmente reconhece que o medo é excessivo ou irracional.
4. As situações sociais ou os estímulos específicos são evitados ou suportados com intensa ansiedade, o que geralmente interfere na rotina e no funcijonamento social do paciente ou causa-lhe intenso sofrimento.
5. O medo ou a esquiva não se devem ao uso de substâncias, a uma condição médica geral ou a outro transtorno mental.

Tratamento
1. Dessensibilização sistemática e técnica de exposição (para fobias específicas) e terapia cognitiva e comportamental (para fobias sociais).
2. Betabloqueadores podem ser úteis em pequenas doses, tomadas antes das situações fóbicas (p.ex., aulas, apresentações públicas, etc.)
3. Para a fobia social generalizada, é indicado o uso de antidepressivos (imipramina, fluoxetina, paroxetina, sertralina ou fenelzina). Considere a possibilidade de encaminhar o paciente para um psiquiatra.

TOC: Transtorno Obsessivo-Compulsivo
Estima-se para este transtorno uma prevalência ao longo da vida na ordem de 2,5% da população. O início dos sintomas se dá, geralmente, na adolescência ou no começo da vida adulta.

Diagnóstico
Obsessões ou compulsões que causam acentuado sofrimento, consomem tempo (tomam mais de 1 hora por dia) ou interferem significativamente na rotina, no funcionamento ocupacional ou relacionamentos sociais do paciente.

Obsessões
Pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que são experimentados como intrusivos e inadequados. A pessoa reconhece que os pensamentos são produto de sua própria mente e tenta ignorá-los ou suprimi-los com algum outro pensamento ou ação.

Compulsões
Comportamentos repetitivos ou atos mentais que a pessoa se sente compelida a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser rigidamente aplicadas e que visam a prevenir ou reduzir o sofrimento. Geralmente, essas compulsões são reconhecidas pelo paciente como excessivas ou irracionais.

Tratamento
Embora não seja, geralmente, curativo, o tratamento desse transtorno pode levar a uma melhora significativa dos sintomas.

Psicoterapia
Encaminhar o paciente para uma terapia comportamental, o que poderá reduzir o prejuízo causado em sua vida pelas obsessões e compulsões.

Medicações
Clomipramina (Anafranil): Administrar em doses divididas, durante as refeições, para minimizar os efeitos colaterais gástricos ou na hora de dormir para minimizar a sedação diurna.
ISRSs (Fluoxetina, Paroxetina, Sertralina, Fluvoxamina, Citalopram): Estão associados a menos efeitos colaterais. Iniciar com dose baixa e aumentar gradativamente para doses superiores às usadas para depressão. Tentar um segundo ISRS antes de considerar o paciente resistente ao tratamento.

Psicocirurgia
É indicada para pacientes graves, resistentes aos tratamentos convencionais. Estima-se uma melhora clínica significativa em 25 a 90% dos pacientes operados, embora ainda sejam necessários estudos controlados para confirmar esse dado.

(TEPT): Transtorno de Estresse Pós-Traumático
Este transtorno tem uma prevalência ao longo da vida estimada em 1 a 14% da população. Pode ocorrer em qualquer idade e os sitnoams geralmente se iniciam nos primeiros três meses após o evento desencadeante.

Diagnóstico
Ocorre em pessoas que foram expostas a um evento traumático (estupro, sequestro, acidente) ou o presenciaram em terceiros. A resposta da pessoa envolveu intenso medo, impotência ou horror.
1. O evento traumático é persistentemente revivido em uma (ou mais) das seguintes maneiras:
- recordações aflitivas, recorrentes e intrusivas do evento, incluindo imagens, pensamentos ou percepções;
- sonhos aflitivos e recorrentes com o evento;
- agir ou sentir cvomo se o evento traumático estivesse ocorrendo novamente (flashbacks, alucinações, ilusões);
- sofrimento psicológico intenso ou reatividade fisiológica quando da exposição a indícios internos ou externos que simbolizam ou lembram algum aspecto do evento traumático (p.ex., data do acontecimento).
2. Esquiva persistente de estímulos associados com o trauma e entorpecimento da responsividade geral (p.ex., redução do interesse, sensação de distanciamento, incapacidade de sentir carinho, etc.)
3. Surgimento de dois ou mais dos seguintes sintomas de excitabilidade aumentada:
- dificuldade em conciliar ou manter o sono;
- irritabilidade ou surtos de raiva;
- dificuldade em concentrar-se;
- hipervigilância;
- resposta de sobressalto exagerada.
4. A duração da perturbação é superior a um mês e está associada a intenso sofrimento ou prejuízo significativo ao paciente

Tratamento

Psicoterapia
Técnica de exposição, relaxamento e técnicas cognitivas.

Medicações
Os pacientes podem ter benefícios com algumas medicações, como no tratamento de sintomas depressivos ou ansiosos associados. Considere a possibilidade de encaminhar o paciente para um tratamento psiquiátrico.

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Quem sou eu

Nascido no Japão como filho de massagista shiatsu em 1947, imigrado ao Brasil em 1959, residente em Marília/SP/Brazil desde 1997.

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